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quarta-feira, 30 de setembro de 2020

SISTEMAS AUTO-ORGANIZADORES FÍSICOS, BIOLÓGICOS, SOCIAIS E EMPRESARIAIS - Francisco Di Biase

 SISTEMAS AUTO-ORGANIZADORES FÍSICOS, BIOLÓGICOS, SOCIAIS E EMPRESARIAIS Francisco Di Biase Resumo O presente artigo discute a extensão da teoria de Ilya Prigogine, Prêmio Nobel de Química em 1976 a campos científicos tanto físicos quanto biológicos e sociais. Mudanças imprevisíveis em sistemas caóticos podem conduzir a emergência de novos padrões de ordem e estabilidade. Bolsas de Valores, empresas e sistemas corporativos utilizam softwares de reconhecimento de padrões econômico-financeiros que conseguem reconhecer, analisar, e propor soluções rápidas, em situações de stress interno e\ou externo, permitindo à organização enfrentar e superar essas agressões. Estes softwares de reconhecimento de padrões são sistemas auto-organizadores, que permitem tomadas de decisões rápidas sem prescindir, no entanto, da capacidade humana da inteligência intuitiva e emocional. As grandes decisões finais, tomadas após as análises dos padrões lógicos durante momentos de crises, são de caráter intuitivoemocional, o que demonstra a importância de levarmos em consideração em toda análise de sistemas empresariais humanos e sociais, os valores e a personalidade humana que são comumente esquecidos ou desprezados por grande parte dos sistemas corporativos. Apresenta-se como ilustrações um estudo de caso usando a técnica do ENEAGRAMA e o “case” exemplar do acidente em Three Miles Island. Conclui-se com a sugestão de se ir “além da lógica” integrando perspectivas transpessoais aos processos de gestão. Palavras-chave: Sistemas Auto-Organizadores. Gestão. Complexidade.  Grand PhD, PhD and Full Professor, World Information Distributed University - Bélgica. Professor de Pós-Graduação, UGB-Centro Universitário Geraldo Di Biase, Volta Redonda, RJ. Honorary Professor, Albert Schweitzer International University - Suiça. Neurocirurgião-Neurologista, Santa Casa e Clínica Di Biase, Barra do Piraí, Rio de Janeiro. Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 124 1 INTRODUÇÃO. CAOS, ESTRUTURAS DISSIPATIVAS E ORDEM POR FLUTUAÇÕES As concepções cibernéticas sobre o fenômeno da auto-organização longe do estado de equilíbrio ficaram de certa forma estagnadas durante os anos 60, do século XX, devido à inexistência de um desenvolvimento matemático, e de uma tecnologia computadorizada capaz de processar sistemas dinâmicos não-lineares complexos. Até que Ilya Prigogine, Prêmio Nobel de Química em 1976, desenvolveu uma extensão da Termodinâmica demonstrando como a segunda lei da Termodinâmica, (lei da entropia, relacionada ao grau de desordem em um sistema), permite a emergência de novas estruturas de ordem a partir do caos. Os sistemas descritos por Prigogine são sistemas auto-organizadores que geram estruturas denominadas estruturas dissipativas à partir de situações energéticas caóticas. Estas estruturas dissipativas são criadas e mantidas através de intercâmbios de energia com o ambiente, em condições longe-do-equilíbrio (também denominadas de não-equilíbrio), e são dependentes de um novo tipo de ordem descrita por Prigogine sob o nome de ‘ordem por flutuações’. São processos auto-organizadores, nos quais surgem ‘flutuações gigantes’ estabilizadas pelas trocas com o meio, em que a estrutura é mantida por meio de uma dissipação de energia, e a energia se desloca gerando simultaneamente a estrutura, em um processo contínuo. Estas estruturas dissipativas surgem de forma imprevisível, como um “salto quântico”, em pontos instáveis do sistema, denominados pontos de bifurcação. Quanto mais complexa a estrutura dissipativa, mais informação é necessária para manter suas interconexões, tornando-a consequentemente mais vulnerável às flutuações internas, e com maior potencial de instabilidade e possibilidades de reorganização. Se as flutuações são pequenas, o sistema as acomoda, não modificando a sua estrutura organizacional. Se, no entanto, as flutuações atingem um tamanho crítico, desencadeiam um desequilíbrio no sistema ocasionando novas interações e reorganizações intra-sistêmicas. “Os antigos padrões interagem entre si de novas maneiras, e estabelecem novas conexões. As partes se reorganizam em um novo todo. O sistema alcança uma ordem mais elevada.” (Prigogine, 1984). Fritjof Capra, em seu livro The Web of Life, resume assim a teoria de Prigogine: Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 125 “Nos seres vivos, processos químicos não-lineares, e irreversíveis, geram ‘loops’ catalíticos, que por meio de ‘feedbacks’ repetidos e auto-amplificados conduzem a instabilidades. Quando uma estrutura dissipativa alcança este ponto de instabilidade, chamado de ponto de bifurcação , um elemento de indeterminação entra na teoria. No ponto de bifurcação, o comportamento do sistema é inerentemente imprevisível. Novas estruturas de ordem e complexidade mais elevadas podem emergir espontaneamente. Então, a autoorganização, a emergência espontânea de ordem, resulta dos efeitos combinados do não-equilíbrio, irreversibilidade, ‘loops’ de ‘feedback’, e instabilidade” A teoria de Prigogine é aplicável tanto aos campos científicos físicos quanto biológicos e sociais e explica, tanto matematicamente quanto experimentalmente, como mudanças imprevisíveis em sistemas caóticos podem conduzir a emergência de novos padrões de ordem e estabilidade em áreas tão díspares como medicina, psicologia, teoria da evolução, sociologia, urbanismo, economia, política, organizações empresariais, astronomia, literatura, artes, filosofia, etc. Nestes sistemas dissipativos, como vimos, quando novos padrões de ordem emergem do caos, desencadeados pelas instabilidades e flutuações, podem gerar um salto quântico, uma mudança nos padrões auto-organizadores do sistema. O melhor exemplo que conheço para compreendermos como esta nova ordem se desenvolve à partir do caos, é o de um líquido sendo aquecido, descrito por Capra (1996) que transcrevo a seguir : “Ocorrem cinco diferentes cenários evolutivos: 1- Inicialmente com o aquecimento contínuo, a parte do liquido mais próxima do calor se torna mais quente do que a superfície do líquido longe do calor. Com isso o calor flui de forma regular da parte baixa do líquido para a superfície. O líquido está em uma condição chamada próxima do equilíbrio, e o calor flui de modo regular e suave do fundo para o topo por um processo denominado condução. 2- Após algum tempo com o aquecimento contínuo, uma mudança no estado do líquido ocorre, e um estado longe do equilíbrio surge. Ele se tornou uma estrutura dissipativa. Neste estado o fluxo do líquido se torna cada vez mais desordenado, com instabilidades e redemoinhos. Com o aumento contínuo de temperatura entre as camadas altas e baixas, muda a forma do fluxo, e o líquido dissipa energia para o ambiente à sua volta para manter a coerência. Moléculas do fluido menos denso no fundo fluem para cima e ao mesmo tempo moléculas da camada superior mais densa do líquido são puxadas para baixo pela gravidade. 3- Com o aquecimento contínuo, o líquido é agitado por flutuações e o fluxo se torna cada vez mais turbulento, e após algum tempo, o sistema alcança um estado de completa desordem. 4- Com as flutuações crescentes, o sistema dissipativo longe do equilíbrio está alcançando um ponto de bifurcação, em que o fluxo não pode ser contido na estrutura em questão. Com o aumento da agitação das flutuações, em torno do ponto de bifurcação, a estutura dissipativa longe do equilíbrio alcança um estado caótico Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 126 5- No quinto cenário, o líquido se transforma em uma nova ordem, e se auto-organiza em uma estrutura completamente nova, formada por células células hexagonais. Prigogine e Stengers afirmam que uma nova ordem molecular se produziu espontaneamente. Esta nova ordem corresponde a uma flutuação gigante estabilizada através da troca de energia com o mundo exterior” (Capra, 2006). 2 SISTEMAS AUTO-ORGANIZADORES HOMEOSTÁTICOS Quando nos sistemas auto-organizadores biológicos, sociais ou comportamentais, o equilíbrio dos níveis de funcionamento é perturbado por alguma mudança, por algum “ruído” (desordem) introduzido no sistema, o sistema pode se reequilibrar e se manter estável, retornando ao seu estado inicial de equilíbrio. Este tipo de sistema, capaz de reequilibração e manutenção constante do funcionamento é denominado sistema homeostático. São sistemas auto-organizadores funcionando em um estado de equilíbrio dinâmico contínuo, conhecido como steady state, que é o estado gerador de entropia mínima, utilizado pelos seres vivos para manutenção do equilíbrio do meio interno. O termo homeostasia foi criado pelo neurologista americano Cannon, para designar o processo de manutenção do equilíbrio do meio interno pelos organismos vivos, considerado uma das características fundamentais da Vida. Os sistemas homeostáticos são responsáveis pela capacidade que temos de enganar o “decreto de morte” (Brillouin) que é a segunda lei da Termodinâmica, a tendência universal para o aumento da desordem (entropia) no universo. Claude Bernard, pai da Fisiologia médica, a ciência que estuda o funcionamento dos seres vivos, em um citação célebre afirmou que “La fixité du millieu interieur est la condition de la vie libre” (o equilíbrio do meio interno é a condição da vida livre). Os estados homeostáticos longe do equilíbrio são a base da vida e da evolução, e permitem que os seres vivos estejam sempre mudando em um processo dinâmico de trocas de informação, matéria e energia, com o meio ambiente, nunca repetindo exatamente seus comportamentos anteriores. Só conseguimos manter nosso equilíbrio vital, e sermos capazes de uma “vida livre”, porque somos sistemas longe do equilíbrio, auto-organizadores e homeostáticos Sistemas sociais como estados, corporações, organizações empresariais, famílias, comunidades etc que criamos para organizar nossas vidas, cooperam continuamente, coordenando suas ações e alterando seus comportamentos de acordo Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 127 com as circunstâncias. Para existirmos, precisamos funcionar como sistemas nãolineares auto-organizadores, homeostáticos longe do equilíbrio, e ainda sermos capazes de atuar de modo interdependente. Esta auto-organização interdependente é a única fonte, ao mesmo tempo, de renovação e caos, pois os sistemas vivos e sociais por sua própria natureza estão sempre em um estado de fluxo energético-informacional permanente que inclui uma fase de caos, auto-organização e renovação. No universo da evolução da vida somente sistemas auto-organizadores homeostáticos, como nós, são capazes de suportar as imensas variações da homeostasia orgânica e ambiental, assimilando a desordem, e ainda serem capazes de continuar funcionando e gerando novos comportamentos criativos novidade e aprendizagem. Vida é auto-organização, aprendizagem, criatividade, geração de plasticidade cerebral e novidades e, como veremos a seguir, autocriação. 3 SISTEMAS AUTOPOIÉTICOS Os sistemas autopoiéticos foram descritos nos anos 70 do século XX pelo chileno Humberto R. Maturana, como tentativa de explicar o funcionamento dos sistemas biológicos de uma forma global. Com esta idéia em mente, descreveu juntamente com Francisco J. Varela que a organização suficiente e necessária que explica um sistema vivo é o fato de ele continuamente ser capaz de se autoproduzir, por meio de um processo que denominaram autopoiese que significa autocriação. Segundo Maturana, esta forma autopoiética, circular de organização distingue os seres vivos desde a ameba até o homem. Os sistemas vivos formam uma rede de processos de produção internos e circulares que os tornam unidades automantenedoras autônomas. Sistemas autopoiéticos são sistemas longe-do-equilíbrio, autoorganizadores, complexos, abertos, dissipativos, auto-referenciais, hierárquicos, homeostáticos e autônomos. Sua função primária é a auto-renovação, que conseguem realizar por meio de uma atividade auto-referencial, em contraste com sistemas alopoiéticos como por exemplo, um robot que só consegue realizar sua função utilizando uma fonte externa de energia e informação. Assim, é comum se definir autopoiése “como uma rede de produção de componentes constituindo recursivamente uma estrutura globalmente estável, e operacionalmente separada do background”. Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 128 Os sistemas autopoiéticos podem ser descritos como sistemas cibernéticos abertos auto-organizadores, em estado de não-equilíbrio, operando em modo hierárquico, possuindo as seguintes propriedades: -Se o sistema autopoiético for fechado, alterando seu delicado equilíbrio dissipativo auto-renovador, todos os processos param e o sistema morre. - Os processos autopoiéticos são cíclicos e não-lineares. - São sistemas auto-organizadores complexos, em que as operações ocorrem em multiníveis cibernéticos hierárquicos , com os níveis superiores contendo todos os níveis inferiores. - A função primária do sistema é a auto-renovação recursiva de sua própria rede de componentes autônomos. Veremos a seguir que as organizações corporativas podem ser entendidas como sistemas auto-organizadores autopoiéticos. 4 A CIBERNÉTICA EMPRESARIAL E O SISTEMA AUTO-ORGANIZADOR GLOBAL Em uma “era de incertezas” com o sistema financeiro mundial interconectado e globalizado, e sendo agredido por crises frequentes, as jogadas do xadrez políticoeconômico global podem ter consequências imprevisíveis para as organizações empresariais. Em países como o Brasil que é parte ativa da rede de investimentos globais, e dependente de investimentos externos, com as mais altas taxas de juros do planeta - o chamado capital volátil -, precisamos estar continuamente antenados e alertas. Podemos de repente necessitar de “antitoxinas” de nosso repertório imunológico empresarial para enfrentar “espécies bacterianas” político-econômicas e financeiras, locais e globais que a todo momento podem agredir nosso organismo corporativo. Bolsas de Valores, empresas e sistemas corporativos, são em sua maioria totalmente dependentes de Tecnologia de Informação, e utilizam softwares de reconhecimento de padrões econômico-financeiros que conseguem reconhecer, analisar, e propor soluções rápidas, em situações de stress interno e\ou externo, permitindo à organização enfrentar e superar essas agressões . Estes softwares de reconhecimento de padrões são sistemas auto-organizadores, que permitem ao investidor ou ao empresário que os utiliza tomadas de decisões rápidas. No entanto não substituem a capacidade de tomada de decisões do cérebro humano com sua Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 129 fantástica inteligência intuitiva e emocional. Frequentemente as grandes decisões finais, tomadas após as análises dos padrões lógicos durante momentos de crises, são de caráter intuitivo-emocional. Isso demonstra a importância de levarmos em consideração em nossa análise de sistemas empresariais humanos e sociais, os valores e a personalidade humana que são comumente esquecidos ou desprezados por grande parte dos sistemas corporativos, como veremos a seguir. 5 AUTO-ORGANIZAÇÃO DE SISTEMAS SOCIAIS E HUMANOS Alvin Toffler em seu livro de 1981, A Terceira Onda, nos lembra que sistemas biológicos, sociais e humanos são sistemas abertos, longe do equilíbrio, pululantes em desordem, em um interminável processo de mudanças. São sistemas autoorganizadores em transformação em um processo contínuo de adaptação e harmonização. Como já vimos anteriormente, este tipo de sistema mantem sua totalidade e integridade dissipando continuamente energia, matéria e informação para seus meio ambientes, que também estão contínuo estado de transformação. Quando as flutuações alcançam um tamanho crítico, perturbando a integridade do sistema, surgem mudanças descontínuas, que evoluem, e se “nuclearizam”, em torno destas flutuações. Em sistemas sociais, estas flutuações são ruídos perturbadores, que provocam o aparecimento de um período de grande desordem, instabilidade, insegurança e caos que pode levar à desintegração da organização social, da empresa, da família, da sociedade ou da personalidade, ou pode se reequilibrar e se reorganizar, e se adaptar em um novo nível, uma nova ordem mais complexa, e mais harmônica. Um exemplo bem recente deste tipo de transformação auto-organizadora social que gerou imensas consequências político-econômicas, sociais e culturais no processo civilizatório que vivenciamos atualmente no planeta foi a ‘debâcle’ da antiga União Soviética. Incapaz de conter as ondas de flutuações internas e externas que desestabilizava seu sistema político-econômico, decorrentes de crescentes instabilidades sociais, e da falta de sustentabilidade da economia do país que aplicava quase metade de seu orçamento na manutenção da chamada “guerra fria”, o sistema se “bifurcou” em múltiplas entidades nacionais que se auto-organizaram em uma nova ordem político-econômica, social e internacional. Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 130 6 ORDEM E CAOS Na história da civilização os sistemas humanos político- sociais e econômicos sempre alternaram ordem e caos. Um período de relativa ordem geralmente é seguido por outro de caos que por sua vez gera uma nova ordem. Como já vimos, sabemos que um período de caos profundo é parte natural e necessária do desenvolvimento de todo sistema vivo e social. Quando estes sistemas alcançam o ponto de bifurcação e de mudança descontínua, uma nova ordem emerge do caos. Jeffrey Goldstein em Predicability and Planned Change in Organizations:Linear and Nonlinear Perpectives (1991), demonstra que : “as flutuações nos meios sociais geram gradientes de instabilidades que afetam os sistemas organizacionais da sociedade ativando o potencial auto-organizador capaz de desencadear as mudanças que vemos diariamente nos telejornais”(Goldstein, 1991). Hoje em dia, nessa Era da Informação com as comunicações ocorrendo de modo instantâneo, à velocidade da luz, esses gradientes de instabilidades são intensamente acelerados pela imensa quantidade de informação distribuída no sistema sócio-econômico-político mundial. Esse processo auto-organizador planetário vem se intensificando e acelerando exponencialmente nas ultimas décadas, com o fluxo de informação em jornais, rádios, TVs, internet, redes sociais como o Facebook, canais de filmes e informação como o Youtube, e por meio de e-mails enviados a todo o momento em quantidades cada vez maiores. Acrescente-se ainda a tudo isso o crescente aumento atual de viagens nacionais e internacionais. Toda esta plenitude de informações, misturando diferentes idéias e culturas, nesta “aldeia global” MacLuhaniana, possui o potencial de agravar as instabilidades e diferenças econômico-sociais políticas e históricas, gerando flutuações e bifurcações civilizatórias. Um exemplo mais atual são as crescentes instabilidades político-econômicas e sociais no Oriente Médio, a chamada Primavera Árabe, que parecem estar provocando nesta região, notadamente no Egito, na Líbia e na Síria, um processo de caos e bifurcação, consequente às flutuações desencadeadas pela instabilidade social, pelo fundamentalismo religioso, e pelo terrorismo armado. Estas contradições e desarmonias estão conduzindo a uma reestruturação das relações econômicas entre as classes, e provocarão, se não ocorrer nenhum imprevisto, o surgimento de uma nova ordem sócio-econômica, política e religiosa mais democrática. Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 131 7 A UNIVERSALIDADE DOS PONTOS DE TRANSIÇÃO Em 1975 Mitchell Feigenbaum, do Los Alamos National Laboratory, nos Estados Unidos, demostrou que existe uma universalidade nos pontos de transição nos diferentes tipos de sistemas que alternam ordem linear e caos profundo. Ou seja, independentemente do tipo de sistema aberto dinâmico que estejamos lidando, é possível calcular os mesmos números universais e determinar os pontos de transição do sistema em sua evolução para o caos. Esses cálculos demostram que sistemas de natureza completamente diferente, se comportam de modo similar quando se tornam caóticos. Após a quarta bifurcação, denominada ponto de Feigenbaum, todo sistema cascateia para um caos total, onde escolhas infinitas criam uma situação em que a liberdade não tem mais sentido. Estes números universais são hoje conhecidos como números de Feigenbaum, e permitem que pesquisadores das mais diversas disciplinas possam prever o início da turbulência em sistemas do mundo real, tais como sistemas ópticos, circuitos elétricos, fluxo de gases, atividade vulcânica, ataques cardíacos, crescimento populacional e organizacional, aprendizagem humana, bolsas de valores, instabilidades político-econômicas etc. 7.1 Atratores Existem quatro modos de comportamento dos sistemas em geral, ou quatro tipos de atratores, que um sistema humano, individual, organizacional ou nacional podem apresentar. Mark Michael em 1992, denominou estes quatro tipos de comportamentos dos sistemas como : 1-Sistemas em estado de equilíbrio 2-Sistemas em estado próximo ao equilíbrio 3-Sistemas em estado longe do equilíbrio 4-Sistemas em estado de caos profundo Outros autores, como T.R. Young , dividem os quatro tipos de comportamento em : 1-Comportamento Linear, em que o processo repete o comportamento anterior, diferentemente do ser humano que nunca repete exatamente um Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 132 comportamento. Tarefas industriais repetitivas tentam imitar este tipo de comportamento. 2-Comportamento Tórus–símile em que o sistema evolui com pequenas variações de caráter previsível. Diferentemente ainda do comportamento humano, pois os comportamentos individuais e sociais variam discreta e previsivelmente, como por exemplo o comportamento diário, repetitivo, de barbear. 3-Comportamento tipo Borboleta, quando o sistema é capaz de se adaptar a novos comportamentos conduzidos por atratores denominados “estranhos”, que possuem duas a dezesseis “bacias” de evolução possíveis. Nestes sistemas o potencial para interferência humana é mais elevado, entrelaçando linearidade e não-linearidade, com comportamentos adaptativos, como por exemplo, um imigrante se adaptando à cultura de um novo país. 4-Caos profundo, quando o processo ultrapassa as dezesseis bacias evolutivas possíveis, ultrapassando a possibilidade de interferência humana, e emergindo em uma forma inteiramente nova de ordem e complexidade. Um exemplo histórico-social relevante deste tipo de evolução para uma nova ordem mais complexa, foi a queda do Muro de Berlim, que foi seguida por uma fase de caos e re-equilibração auto-organizadora na antiga Alemanha Oriental, e nos demais países do leste europeu, quando subitamente se libertaram dos grilhões do totalitarismo soviético. Young aplicou os Pontos de Feigenbaum às transformações sociais, demonstrando que eles representam índices de gradientes relacionados ao controle dos recursos entre os diversos setores da sociedade, e que nas sociedades humanas os gradientes de energia-informação constituem os grandes abismos entre as diferentes nações e entre os diferentes setores da sociedade, como por exemplo o controle de recursos, força, proventos, comunicação e status. As sociedades funcionam sem disrupção até a quarta bifurcação Feigenbaum, o que corresponde a uma diferença no controle dos recursos de até um para dezesseis. Isto significa que para a sociedade permanecer estável, o setor mais rico não pode possuir recursos que ultrapassem dezesseis vezes a menor receita da população. Diferenças maiores do que 16 (quatro bifurcações), nos preços do mercado, podem conduzir organizações e indivíduos para caminhos ilegais de geração de receitas, tais como roubo, cirurgias desnecessárias, fraude, extorsão, poluição, prostituição, etc. Além deste ponto as bifurcações se acumulam e os recursos necessários para o controle social ficam fora de contrôle. Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 133 “Setores desprovidos de recursos manifestarão comportamentos não-lineares para redistribuir a riqueza e o bem-estar, fugindo da racionalidade linear do mercado”, afirma Young. Nesta perspectiva o crime é entendido como um comportamento nãolinear, auto-organizador, no sistema de distribuição de riqueza. Cientistas do Santa Fé Institute of Complexity, no Novo México, USA, um dos maiores centros de pesquisa na área de auto-organização do mundo, descobriram que sistemas complexos adaptativos como indivíduos, famílias organizações e nações, se adaptam mais efetivamente em ambientes turbulentos, funcionando em um modo autoorganizador denominado “no limite do caos”. São comportamentos que misturam previsibilidade e imprevisibilidade, e se situam em algum lugar no interior dos sistemas tipo borboleta, longe do equilíbrio. Na compreensão dos sistemas auto-organizadores sociais, outro fator que precisamos sempre levar em consideração é a capacidade de resiliência do sistema. Sistemas resilientes são sistemas capazes de resistir às mudanças por um longo tempo. Possuem interconexões suficientemente flexíveis e rápidas para absorver as flutuações em andamento, impedindo que uma bifurcação, uma reorganização se processe. Jantsch (1980) demonstrou que sistemas com estas características costumam ser metastáticos, correndo o grande perigo de se desintegrar quando surgem bifurcações imprevisíveis, que não podem ser restringidas ou controladas. Prigogine afirma que “cada caminho pode conduzir a uma direção completamente diferente e abrir a possibilidade de diferentes caminhos auto-organizadores” Portanto, quando um sistema alcança um ponto de bifurcação uma variedade de caminhos podem se abrir para ele. Qual caminho ele “escolherá” em cada uma destas encruzilhadas determinará as possibilidades para seu futuro. Em um famoso livro de 1981, Entropy: A New World View, Jeremy Rifkin já afirmava que a reorganização sempre tende para maior complexidade , integração, interconexão, e maior fluxo de energia, e que o sistema ao se tornar mais complexo, após cada reorganização transformadora, fica mais vulnerável a flutuações e reestruturações. Portanto, o aumento de complexidade cria condições para novas reorganizações, acelerando a evolução, e o fluxo de energia que flui através do sistema. Erwin Laszlo, em The Age of Bifurcation, 1991, afirma que nossa civilização se encontra em um ponto de bifurcação entre duas Eras, no limiar de uma bifurcação transformadora. Concordo plenamente com a visão do Laszlo, pois acredito que atualmente estejamos passando por uma situação revolucionária, que pode ser uma bifurcação na história da Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 134 humanidade. Minha impressão é que nossa civilização está passando por uma adolescência tecnológica com todas as imensas realizações e turbulências características desta idade. Uma época plena de situações instáveis e perigosas, em que os esforços para manter a dominação político-econômico-social e o controle das fontes energéticas fósseis, estão impedindo a mudança para fontes alternativas e mais “limpas” de energia, e com isso estamos retardando a emergência de uma nova Era Holística, mais ecológica, mais yin, mais harmônica, feminina e espiritualizada. A grande dificuldade que estamos enfrentando, é que estamos historicamente próximos a um ponto de bifurcação, e não há como neste ponto de evolução sistêmica - segundo as teorias auto-organizadoras e a teoria do caos - prever o caminho que nossa civilização tomará no futuro. Não existe nenhuma lei universal válida a partir da qual possamos deduzir a evolução de nossa civilização, o momento quando se manifestará o ponto de bifurcação e a mudança de paradigma. Tal como em Medicina quando afirmamos que cada caso é um caso, Prigogine e Stengers demonstram que cada sistema é um caso separado. Segundo eles, quando um ponto de bifurcação é alcançado, descrições determinísticas não funcionam mais. Sabemos que o caos pode eclodir em sistemas auto-organizadores e interdependentes, nos quais a complexidade aumenta o fluxo de energia e a interdependência entre eles, elevando a vulnerabilidade às dinâmicas caóticas. Esse o grande risco que corremos enquanto civilização: se estivermos na iminência de uma bifurcação civilizatória, podemos evoluir para uma nova cultura de paz e de preservação da vida, alcançando “o céu na terra”, ou afundar no caos e no inferno da autodestruição. O mesmo ocorre em Medicina nos processos psicoterapêuticos: quando atingem um ponto de bifurcação, não é possível prever qual flutuação provocará uma mudança no estado psicológico do paciente. Tudo o que podemos fazer como terapeutas, é apoiar o paciente em sua trajetória, depois que ela se manifesta. Nestas situações de instabilidade próximas a um ponto de bifurcação, flutuações que parecem pequenas podem desencadear um enorme efeito no futuro, e outras que parecem ter grande importância podem na verdade provocar pequenos efeitos, fato que é conhecido na Teoria do Caos como “Efeito Borboleta”. Existe um pouco de verdade na metáfora que afirma que “ se cortamos um talo de grama afetamos todo o universo”, ou no bem conhecido ditado que diz que “o bater de asas de uma borboleta na praça da Paz Celestial em Pequim pode desencadear um furacão em Nova York”. Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 135 Tudo isso nos demonstra como nos sistemas sociais e humanos em processo de transformação, a seleção do caminho futuro não pode ser controlada. Este aspecto de imprevisibilidade é de extrema importância e precisa ser compreendido por líderes empresariais e políticos, consultores organizacionais, sociólogos, psicoterapeutas, comentaristas e todos que procuram compreender, prever ou controlar futuros desenvolvimentos em sistemas humanos e sociais. Existem limites para predizermos e controlarmos o futuro das nações, organizações, famílias, e indivíduos! 8 UM EXEMPLO CORPORATIVO Existe um modelo auto-organizador empresarial desenvolvido por Knowles, fundamentado no Eneagrama, que é um sistema de avaliação de personalidades muito utilizado nos meios holísticos. Neste modelo de sistema empresarial, o líder participa semanalmente de encontros e da elaboração de projetos, com todos os membros do time. Durante todo o processo de decisões, cada um realmente ouve a todos os outros, compartilhando idéias, “insights”, correções e ajustes, mantendo assim todos intensamente interconectados. Knowles afirma que após estas reuniões, à noite, quando se recolhia, sempre rezava pelo bom andamento do processo. Sempre enfatizei em meus livros, a importância de em nossa vida diária sempre utilizarmos um método de relaxamento mental, uma holopráxis, como denominava meu grande amigo Pierre Weil, reitor da Universidade Holística-UNIPAZ de Brasília. Este método de relaxamento pode ser uma oração específica de sua tradição espiritual, uma contemplação, uma meditação, ou a prática do yoga, ou do tai chi chuan, ou até mesmo uma simples respiração profunda com a mente voltada para o universo e a interconexão espiritual com o Todo, ou qualquer outra técnica que lhe toque mais o coração. Todas estas psicotecnologias estão hoje exaustivamente comprovadas pela neurociência, e são capazes de turbinar nossa inteligência intuitiva, provocando “insights” e sincronicidades evolutivas em nossa vida pessoal e profissional. Se conseguirmos aplicá-las em nossa organização empresarial, de modo que todos utilizem seus benefícios, nossos negócios prosperam de um modo inesperado e natural, incapaz de ser compreendido por quem não possui uma visão de mundo baseada no novo paradigma nas Ciências Holísticas e na Psicologia Transpessoal. Mas voltando ao nosso caso em questão, a aplicação do modelo corporativo auto-organizador descrito acima, provocou uma transformação empresarial de sucesso, Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 136 na qual foram enfocados três domínios dos sistemas auto-organizadores: identidade, interrelacionamento, e informação. Ficou muito bem evidenciado que com a informação sendo compartilhada abertamente, o inter-relacionamento pessoal se tornou mais autêntico, e as pessoas passaram a consultar diretamente outras pessoas que possuíam informação relevante para seu trabalho. Com isso as trocas de conteúdo passaram a ser mais rápidas, aprimorando a qualidade da informação. Com base na estrutura do Eneagrama, foi criado um Centro de Contrôle, e um mapa do processo de trabalho foi colocado em um local bem visível para todos, mostrando ao mesmo tempo o todo e as partes do processo em que o grupo estava engajado. A interação neste tipo de processo auto-organizador é contínua, e o mapa evolui com o tempo, mantendo os padrões auto-organizadores vivos. Este exemplo de processo de liderança auto-organizadora demonstra como é possível, interagir o tempo todo de modo dinâmico, funcionando em um domínio longe do equilíbrio, diferentemente de empresas baseadas em comando e controles hierárquicos em que os processos auto-organizadores tendem a ocorrer de maneira velada e subterrânea, frequentemente em conflito com os objetivos da organização. Empresas auto-organizadoras, são como sistemas vivos, com seus processos auto-organizadores interagindo continuamente, fazendo com que o fluxo de energia, a distribuição e o significado da informação, e a criatividade fluam livremente. Com isso, alcançam objetivos mais rapidamente e de forma mais efetiva, surgindo pouca resistência às mudanças. Com toda informação compartilhada a empresa vai se autoorganizando espontaneamente, os times vão se formando mais naturalmente, e surgem processos operacionais de trabalho mais efetivos. Como todos participam ativamente do processo de criatividade, os envolvidos no processo encontram mais significado no trabalho. Lembramos ainda que os processos e padrões de transformação autoorganizadores são de natureza holística, e fractal, podendo portanto ser utilizados em qualquer tipo de organização, independente do tipo de trabalho que realizem. São aplicáveis a qualquer nível da escala empresarial, tais como o desenvolvimento pessoal, o ensino, coaching, mentoring, no desenvolvimento de liderança, no processo operacional , e no trabalho social. É de suma importância lembrarmos que como afirma Knowles “o ponto critico se relaciona não ao trabalho físico, mas ao modo como as pessoas interagem para realizar seu trabalho”. Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 137 9 ESTADOS DE EMERGÊNCIA Um outro ponto importante que precisamos levantar, são as situações de emergência corporativa, quando não possuímos controle adequado sobre o evento que está ocorrendo, e temos pouco tempo para tentar realizar muitos procedimentos. Nestes eventos, o gerenciamento normal fica fora de controle. Tudo muda instantaneamente, e o sistema empresarial geralmente começa a se comportar espontaneamente como um sistema vivo auto-organizador. Todos começam a funcionar de modo mais intuitivo, sabendo o que precisam realizar, e do que são capazes. Sem discussão, e sem interferência hierárquica todos procuram ajudar uns aos outros, criando frentes de trabalho geralmente muito eficazes, com energia, troca de informação e criatividade fluindo de forma espontânea e abundante, com todos orgulhosos e felizes por enfrentarem a crise juntos. A experiência de lidar com situações de emergência demonstra que nestes casos os processos de auto-organização vão se estruturando de modo espontâneo e natural. Mas, o que fazer nos casos em que os sistemas evoluem para situações caóticas com perda total do controle, impedindo a continuação do funcionamento do sistema? 10 UM CASE EXEMPLAR Um case exemplar, que demonstra esta situação na história corporativa mundial e que gerou um enorme aprendizado que foi fundamental para a evolução dos sistemas de controle nos reatores de geração de energia nuclear, foi o acidente nuclear da usina de Three Mile Island, nos USA, nos anos 70. Quando a emergência foi detectada, os presentes na sala de contrôle do reator começaram a propor soluções, que muitas vezes eram incapazes de serem levadas adiante pela falta de monitorização de informações mais exatas sobre o que estava ocorrendo. Na confusão estressante do momento cada um tentava impor sua opinião e foi impossível se chegar a um consenso, capaz de conter a situação de emergência, e impedir o derretimento do reator. A partir desta experiência foi desenvolvido pela Agência Internacional de Energia Atômica uma proposta de criação de Centros de Contrôle em todas as usinas nucleares do planeta. Estes Centros de Contrôle, possuem características auto-organizadoras, e se situam fora da sala de controle do reator, monitorando através de sistemas computadorizados Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 138 todo o processo de geração de energia. Quando ocorre uma emergência, pessoaschaves com conhecimento para a compreensão da situação e para a tomada de decisões, se dirigem para este Centro de Contrôle. Lá, com acesso ao fluxo contínuo de informação vindo de todas as partes do sistema, e interagindo de modo controlado e já treinado, estes personagens-chaves, conseguem monitorar todo o processo em andamento e encontrar rapidamente a melhor solução para a situação emergencial. Pude me inteirar melhor deste processo auto-organizador quando visitei a Usina Nuclear de Angra do Reis tendo como cicerone um colega, que participa deste tipo de treinamento e controle emergencial, e fiquei deveras impressionado com todo o aparato tecnológico, a organização (auto-organização) estratégica, e o preparo e qualificação do pessoal do centro de controle de emergências da usina. 11 CONCLUSÕES Quando aplicamos padrões de liderança auto-organizadora aos sistemas corporativos, conseguimos alcançar resultados superiores, e todos se sentem muito mais integrados e felizes, tornando o sistema altamente coerente. Estas estratégias de liderança auto-organizacional permitem alcançar o sucesso empresarial de forma muito mais rápida e mais eficiente do que utilizando os sistemas clássicos com controle hierarquizado. Para que esta estratégia auto-organizadora funcione, é preciso que sejamos capazes, no entanto, de realizar o que Knowles denomina a “dança da liderança”, nos movimentando entre todas as situações, e exercendo diversos papéis de liderança ao mesmo tempo, de forma sutil e consciente, conforme as necessidades e as demandas vão surgindo. 11.1 O nascimento de um novo mundo Sri Aurobindo filósofo indiano contemporâneo nos ensina: “Lembrem-se que vocês vivem um tempo excepcional em uma época única, e que têm essa grande felicidade, esse incalculável privilégio, de estarem presentes ao nascimento de um novo mundo” Vivenciamos no mundo de hoje o aparecimento de sistemas de inteligência artificial autônomos “guiados por sua própria lógica”, como descreveu Seymor Papert, do MIT. Isso tem levado ao aparecimento de inúmeras análises críticas, Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 139 técnicas e filosóficas, por pessoas preocupadas com a possibilidade desses sistema artificiais começarem a tomar decisões autônomas independentes do controle humano, e assim dominarem a espécie que os criou. Algo como no filme O Exterminador do Futuro III. Hoje em dia supercomputadores com redes neurais maciçamente paralelas desenvolvidas a partir da engenharia reversa do cérebro humano, como por exemplo os modelos da Thinking Machines de Danny Hillis, possuem a capacidade de realizar mais de 100 trilhões de cálculos por segundo. Estas redes neurais artificiais funcionam à velocidade da luz, possuindo uma capacidade de computação e memória que excedem em muito à humana, a qual funciona apenas à velocidade de 100m\s. Muitos pesquisadores e filósofos da área de inteligência artificial acreditam que brevemente veremos o aparecimento de sistemas de inteligência artificial conscientes, pois consideram que este “salto quântico” seria somente uma questão de quantidade de processamento a qual desencadearia uma mudança de qualidade e o aparecimento da consciência! Confesso que me sinto perplexo com este tipo de proposta, pois a geração de consciência exige muito mais do que simplesmente capacidade computacional, como temos demonstrado em nossos papers e livros nos últimos vinte anos!! Ray Kursweil, em seu maravilhoso livro A Era das Máquinas Artificiais, nos mostra que em nosso dia a dia, 90% da computação hoje realizada no planeta é feita por maquinas artificiais! Criamos um novo mundo em que já estão se tornando realidade, lentes de contato implantadas nos olhos funcionando como telas de computador ou como câmeras digitais, capazes de acessarem a internet! Imagens já podem ser projetadas diretamente nas retinas, criando projeções tridimensionais de alta resolução. Tecnologia de informação baseada em sistemas auto-organizadores, com interfaces neurais para reconhecimento visual de padrões, e conexão de banda larga com o cérebro humano, brevemente estarão acessíveis a quem puder pagar pelo uso da tecnologia. Pesquisas em andamento estão desenvolvendo implantes neurais capazes de ampliar visual e auditivamente a percepção, a interpretação, a memória e o raciocínio humanos, nos tornando super-humanos. Com tudo isso, afirma Kursweil, estamos evoluindo para uma raça de cyborgs em que para conseguirmos acompanhar o desenvolvimento da tecnologia de informação e inteligência artificial que nós mesmos criamos, teremos que nos misturar às máquinas artificiais, implantando chips em nossos cérebros e nossos corpos! O que na verdade já estamos concretizando de forma Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 140 primitiva por meio das próteses ortopédicas, cardíacas, otológicas, neurocirúrgicas etc, que rotineiramente utilizamos em nossos hospitais. Na área de Educação, Comunicação e Negócios , iFones e tablets como o iPad de Steve Jobs já se tornaram coisas rotineiras, e realizamos teleconferências e seminários à distância. Até revoluções em países distantes , como a recente Primavera Árabe, têm sido deflagradas com a ajuda de redes sociais omnipenetrantres como o Facebook que já alcançam um bilhão de usuários. As transações financeiras mundiais são realizadas on line, e grande parte das nossas compras de livros, CDs e DVDs musicais, vídeos e games, são feitas na Web. Segundo Kursweil, em países desenvolvidos pós-industriais, em uma residência de classe média existem mais de 100 computadores embutidos em sistemas de comunicação e eletrodomésticos. Nossos automóveis são totalmente dependentes de tecnologia computadorizada, e em países como o Japão e os USA já existem robots domésticos e estradas inteligentes. Na área da nanotecnologia, nanorobots microscópicos (nanobots), estão sendo desenvolvidos no setor de saúde, devendo revolucionar as formas de diagnóstico e tratamento da medicina atual. O presidente da Google recentemente afirmou que até o final de 2012, toda a literatura escrita pela espécie humana estará digitalizada em seus servidores! Percebem que isto significa, digitalizar toda a literatura escrita nos últimos milênios em todas as línguas! Parece ficção científica como as séries de TV e os filmes do tipo Star Treck. Kursweil cita Ben Shan com quem sinto me plenamente integrado quando ele afirma: “Desde que me entendo por gente, queria ter tido a sorte de estar vivo em um grande momento histórico – quando alguma coisa grande estivesse acontecendo, como uma crucificação. E, de repente, percebi que já estava”. Realmente, parece que estamos vivendo, o grande momento histórico de uma civilização, uma época maravilhosa, o momento evolutivo de aquisição da Tecnologia, a qual nos permitirá alcançar saúde e inteligência plenas, e ao nos misturar com os computadores, talvez alcançar a imortalidade de nossas consciências. Estamos conquistando o sistema solar, e algum dia alcançaremos as galáxias, e provavelmente todo o universo. É somente uma questão de tempo! No entanto, se não nos mantivermos alertas, esta conturbada adolescência tecnológica que pode nos conduzir às estrelas, e acabar com as doenças e a pobreza, criando uma Era maravilhosa de paz e prosperidade para toda a humanidade, pode Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 141 também nos enveredar pelo caminho da guerra, da destruição da Vida e da maldade, levando à destruição do planeta e da Vida como a conhecemos. Não me parece inviável, - e me parece estarmos caminhando aceleradamente nesta trilha - que ao vislumbrar a possibilidade de uma catástrofe global, nossos filhos artificiais, a espécie inteligente que criamos, queiram se defender da própria destruição, assumindo o controle de tudo e nos salvando! Será esse nosso destino? Sermos salvos pela espécie artificial que criamos? 11.2 O Futuro das Corporações Hoje decisões corporativas são efetuadas por meio de um grande numero de decisões humanas, tomadas no contexto da empresa. O que é decidido é condicionado pela dinâmica auto-organizadora da corporação que na verdade acaba por assumir características distintas das mentes humanas envolvidas. Corporações como a Apple ou a IBM, tomam decisões boas ou ruins, por meio da dinâmica autoorganizadora corporativa de um modo diferente das que um indivíduo envolvido no sistema empresarial, tomaria isoladamente. Ben Goertzel, da área de inteligência artificial, com quem tivemos o privilégio de co-autorar junto com outros pesquisadores da consciência como Karl Pribram, Fred Alan Wolf, Richard Amoroso, Ruppert Sheldrake, Amit Goswami, Stanislav Grof, os livros Science and the Primacy of Consciousness (Noetic Press) e Complementarity of Brain and Body (Nova Science Publishers) afirma que : “É perfeitamente razoável que olhemos as decisões corporativas tomadas por meio de humanos, do mesmo modo que olhamos as decisões humanas tomadas por meio de neurônios. Assim de uma maneira muito prática e concreta, faz sentido pensar nas corporações como possuindo mentes próprias. E parece bem possível que empresas vistas como mentes coerentes, auto-organizadoras automodificadoras e emergentes, possam funcionar como corporações superinteligentes. Em um mundo pós-moderno em que o avanço tecnológico utilizando nanotecnologia e femtotecnologia, diminua radicalmente a escassez material, a importância do pensamento econômico diminuirá radicalmente, e as corporações capazes de tomar decisões por conta própria, se tornarão progressivamente irrelevantes em um mundo pós-Singularidade ( no sentido criado por Ray Kursweil)”. Como as corporações são inteligentes o bastante para perceber estas mudanças tecnológicas tanto à nível nano quanto femto, elas provavelmente lutarão para impedir este processo progressivo gerador de irrelevância para elas, e caberá a nós, neurônios Int. J. Knowl. Eng. Manage., ISSN 2316-6517, Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 123-146, mar./maio, 2013. 142 corporativos, sermos capazes de evoluir e continuar nos guiando por sistemas éticos de valores auto-organizadores voltados para a preservação da Vida sempre em transformação. Como afirma Fernando Pessoa: "O valor das coisas não está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem... Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis" . Artigo recebido 04 de dezembro de 2012 e aceito para publicação em 20 de dezembro de 2012 Abstract This paper discusses the extension of Ilya Prigogine (Nobel Prize in Chemistry in 1976) theory to both physical, biological and social scientific fields. Unpredictable changes in chaotic systems can lead to emergence of new patterns of order and stability. Stock Exchanges, corporate and enterprise systems using pattern recognition software financial-economic that can recognize, analyze, and propose solutions fast, in situations of internal stress and \ or external, allowing the organization to address and overcome these aggressions. These recognition software patterns are self-organizing systems, which enable rapid decision making without giving up, however, the human capacity for intelligence intuitive and emotional. The big final decisions, taken after the analysis of the logical patterns during times of crises, show an intuitive and emotional character, which demonstrates the importance of taking into account in any analysis of business systems, human social values and human personality, which are commonly forgotten or despised by most enterprise systems. It is presented for illustration a case study using the technique of ENNEAGRAM and a discussion about Three Mile Island incident. We conclude with the suggestion to go "beyond logic", adopting transpersonal perspectives integrated to traditional management processes. Key Words: Self-Organizing systems. Management. Complexity. Referências BAK, P., TANG C. e WIESENFELD K.. Self-organized criticality. Physical Review A 38:364-374, 1988. 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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

O Diálogo Criativo Mente-Cérebro e DNA



O Diálogo Criativo Mente-Cérebro e DNA

Francisco Di Biase Grand PhD, PhD, Full Professor, World Information Distributed University, Bélgica Professor Honorário Albert Schweitzer International University, Suíça Professor de Pós-Graduação, Centro Universitário Geraldo Di Biase- UGB, Volta Redonda, Rio Chefe Serviço de Neurologia-Neurocirurgia e Centro de Tomografia Computadorizada, Santa Casa e Depto de Mapeamento Cerebral Computadorizado, Clínica Di Biase, Barra do Piraí, Rio de Janeiro, Brasil.


O Aspecto Molecular da Consciência
Os sistemas contemporâneos de neuroimagem que hoje utilizamos rotineiramente, como a ressonância magnética funcional (fMRI), a tomografia computadorizada com emissão de pósitrons (PET scan), o SPECT(single photon emission computed tomography) e o mapeamento cerebral computadorizado (brain mapping), demonstram que nosso cérebro não diferencia imaginação de realidade. As áreas cerebrais ativadas durante a imaginação são as mesmas ativadas durante a observação da imagem real, ou durante uma percepção sensorial. Quando nosso cérebro entra em contato com novidades ambientais, a imaginação, as visualizações e as lembranças significativas que vivenciamos, assim como os insights psicoterápicos, as terapias mente-corpo, a reabilitação, a meditação, a oração, e mesmo o exercício físico, estimulam a liberação de mensageiros químicos, e o processo de expressão genética e síntese protêica nos neurônios. Estas proteínas sintetizadas são a base molecular da plasticidade cerebral, e irão estruturar sinapses e novas redes neurais. Este processo que a seguir descrevemos de modo mais detalhado, é o fundamento da memória e da interação cérebro-mente-consciência.
O processo se inicia quando o córtex cerebral, que faz a interface com o meio ambiente, é estimulado pelas novidades do dia a dia, e envia os estímulos para o hipocampo (veja figura 1) que é um sítio temporário de armazenamento de memórias aprendizagem e comportamento. Esta interação ocorre durante o sono, o sonho e o repouso, quando a mente consciente não está ativa. Nestes períodos, o hipocampo estabelece um “diálogo atualizador”, a nível inconsciente com o córtex, um processo de repetição, atualizando e consolidando as memórias das novas experiências de vida de um modo adaptativo. Se extirparmos o hipocampo, antes do animal adormecer, a memória desaparece. Em humanos a retirada do hipocampo bilateralmente ocasiona um quadro grave de amnésia para fatos recentes.

Figura 1-O “diálogo atualizador” entre o córtex cerebral e o hipocampo. O hipocampo é um local temporário de armazenamento de memórias, aprendizagem e comportamento (modificado de Rossi, 2008).

Em um já clássico trabalho de 2001, Lisman & Morris descrevem assim este diálogo de atualização entre o córtex e o hipocampo:
“...a informação sensorial recente é direcionada através do córtex até o hipocampo. Surpreendentemente só o hipocampo aprende realmente neste momento – diz-se que ele está online. Mais tarde, quando o hipocampo está offline (durante o sono), repete a informação armazenada, transmitindo-a ao córtex. O córtex é considerado um aprendiz lento, capaz de armazenar memórias duradouras somente como resultado da repetição da informação do hipocampo. O hipocampo é apenas um armazém temporário de memórias. Uma vez que os traços de memória se estabilizem no córtex, as memórias podem ser acessadas até mesmo quando o hipocampo é removido. Atualmente há evidência direta de que alguma forma de repetição ocorre no hipocampo... Estes resultados apóiam a idéia de que o hipocampo é o aprendiz veloz online que ‘ensina’ ao córtex, aprendiz mais lento offline”.
O hipocampo, faz parte do sistema límbico, que é o circuito responsável por grande parte de nossas respostas emocionais. Portanto, através do circuito límbico as novidades memorizadas no hipocampo irão provocar manifestações emocionais no organismo. Este circuito límbico, atua através do hipotálamo, que é relacionado ao controle do sistema neurovegetativo (simpático e parassimpático), e da hipófise (pituitária), a maestra de todas as glândulas . Assim, por meio da estimulação do chamado eixo hipotálamo-hipófisário, são liberadas na corrente sanguínea moléculas-mensageiras hormonais, que irão ativar as glândulas endócrinas provocando a liberação de seus respectivos hormônios no organismo. Esses hormônios e os hormônios hipofisários, irão se ligar aos receptores das membranas celulares das células corporais e dos neurônios, provocando a liberação de segundos mensageiros proteicos no interior das células. Estes segundos mensageiros, por sua vez, migram para o núcleo das células onde sinalizam aos genes reguladores e efetores no DNA, para que iniciem a síntese protêica. A criação de novas sinapses (sinaptogênese) depende desta síntese contínua de proteínas para a formação de novas redes neurais, e de novas memórias, facilitando a plasticidade cerebral. Sem o perfeito processamento deste diálogo mente-cérebro-DNA, seria impossível a manifestação da vida inteligente e da consciência.
Lembramos ainda que o sistema imunológico também interage ativamente com este circuito mente-cérebro-gene, influenciando a liberação de imunotransmissores, e a ativação de células (linfócitos T e B, macrófagos, etc) produtoras de anticorpos, que são os responsáveis pelo rastreamento e eliminação de bactérias, vírus e células anormais, ou seja pelo reconhecimento do self e do não-self imunológico. Fenômenos experienciais como alegria, felicidade, compaixão, criatividade, tristeza, depressão, ansiedade, stress, especialmente quando se tornam crônicos, podem alterar a modulação informacional deste sistema psiconeuroendócrino-imunogenético , e diminuir a produção de neurotransmissores como as endorfinas, a serotonina, a dopamina etc , influenciando a competência imunológica. A depressão persistente na imunocompetência pode ocasionar uma diminuição da capacidade dos anticorpos rastrearem células anormais, como por exemplo, as células cancerígenas e levar ao desenvolvimento de um câncer em nosso organismo.
É nesse contexto que iremos analisar o processo de percepção e/ou criação de novidades que ao estimular a geração de novas redes neurais e novas memórias, geram uma espiral dinâmica de interações moleculares contínuas entre a consciência, o cérebro, o sistema imunológico e o DNA.
Facilitando a Plasticidade Cerebral, Essência da Criatividade

Em 2006, Eric Kandel, laureado com o Premio Nobel de Medicina, por seu magnífico trabalho sobre os fundamentos da memória, e autor da surpreendente autobiografia científica Em busca da Memória, descreveu sua trajetória científica em íntima relação com sua vida, de maneira humana e fascinante.
No capítulo “Um diálogo entre as sinapses e os genes” em seu livro In Search of Memory, Kandel detalha assim o processamento molecular da memória:
“ Propusemos que a expressão genética converte na sinapse, memória a curto-prazo em memória a longo-prazo, e que a sinapse estimulada pelo aprendizado, envia um sinal ao núcleo, para “ligar” (turn on) certos genes reguladores. Na memória a curto-prazo, as sinapses utilizam o AMP cíclico e a proteína kinase A para provocar a liberação de mais neurotransmissor. Hipotetizamos que na memória a longo-prazo esta kinase se move da sinapse para o núcleo, onde ela ativaria proteínas que regulam a expressão genética. Tínhamos que identificar o sinal enviado da sinapse para o núcleo, encontrar os genes reguladores ativados pelo sinal, e então identificar os genes efetores ligados pelo regulador ... Descobrimos que enquanto um único pulso de serotonina aumenta o AMP cíclico e a kinase A, na sinapse, pulsos repetidos de serotonina produzem concentrações ainda maiores do AMP cíclico, fazendo com que a kinase A se mova para o interior do núcleo, onde ela ativa os genes. A kinase A recruta outra kinase, chamada MAP kinase, também associada com o crescimento sináptico, que também migra para o núcleo. Confirmamos então que uma das funções do treinamento sensibilizador repetitivo - o porque da prática levar à perfeição- é desencadear os sinais apropriados na forma de kinases que se movem para o núcleo. Uma vez no núcleo, o que essas kinases fazem? Sabíamos, de estudos recentemente publicados sobre células não-neuronais, que a kinase A pode ativar uma proteína regulatória chamada CREB (cyclic AMP response element-binding protein). Isto nos sugeriu que a CREB pudesse ser um componente chave do interruptor ( switch) que converte facilitação a curto-prazo nas conexões sinápticas, em facilitação a longo-prazo, e crescimento de novas conexões. Em 1990 descobrimos que a CREB é, com efeito, essencial para o fortalecimento a longo-prazo das conexões sinápticas relacionadas à sensibilização. Ao bloquear a ação da CREB no núcleo de um neurônio, bloqueamos o fortalecimento das conexões sinápticas a longo-prazo, mas não as de curto-prazo! Isto era impressionante: ao bloquear esta única proteína regulatória, bloqueava-se o inteiro processo de transformação sináptica a longo-prazo!
Então, mesmo tendo dito por longo tempo que os genes do cérebro são os governantes do comportamento, os mestres absolutos de nosso destino, nosso trabalho demonstrou que tanto no cérebro como na bactéria, os genes são também servos do meio ambiente. Eles são guiados por eventos do mundo externo”.

Em 2001 e 2006, Kandel demostrou que a expressão genética e a plasticidade cerebral podem ser facilitadas por psicoterapia:
“A psicoterapia ou o aconselhamento psicológico são efetivos e produzem mudanças à longo prazo no comportamento, por meio da aprendizagem, desencadeando mudanças na expressão genética que altera as conexões sinápticas provocando mudanças estruturais, que mudam o padrão anatômico das interconexões entre as células do cérebro. Com o aumento da resolução de imagens cerebrais, teremos avaliações quantitativas do resultado da psicoterapia...
De maneira simplificada: a regulação da expressão genética por fatores sociais faz com que todas as funções do corpo, incluindo todas as funções do cérebro, sejam suscetíveis às influências sociais. Estas influências serão incorporadas biologicamente às expressões modificadas de genes específicos, em células nervosas específicas, de regiões específicas do cérebro. Estas modificações socialmente influenciadas são transmitidas culturalmente”.

Hoje, imagens de ressonância funcional de alto campo, como a que reproduzimos abaixo, da revista inglesa NewScientist, demonstram em tempo real, tal como previu Kandel, a dinâmica entre o córtex e o hipocampo:


Figura 2 - De sua localização central, o hipocampo (amarelo) conecta regiões distantes do córtex (vermelho) envolvidas em uma lembrança particular. Nesta imagem, o cérebro foi tornado semitransparente, e se superimpôs uma imagem de ressonância funcional da atividade cerebral com uma imagem de ressonância magnética de sua estrutura.


Em 2008, Ernest Rossi, conhecido terapeuta ericksoniano, utilizou esta constatação de Kandel para descrever um modelo psiconeurocientífico por meio do qual a psicoterapia e a hipnose terapêutica, seriam capazes de estimular a plasticidade cerebral por meio de “um diálogo criativo com nossos genes”
Afirma ele : “A psicoterapia e a hipnose terapêutica podem ser descritas por um modelo neurocientífico que demonstra serem estas técnicas capazes de estimular a plasticidade cerebral, e gerar um dialogo criativo com nossos genes”.
Seu modelo nos fascina pela possibilidade de sua aplicabilidade em todos os campos do conhecimento, por meio de uma nova Bioinformática, a ciência que descreve os processos de transdução da informação durante a interação mente-corpo-gene.
Classicamente o processo de criatividade, capaz de estimular a sinaptogênese gerando novas redes neurais e novas memórias, é compreendido como um processo de quatro estágios:
Estágio um: Ter uma idéia e começar a trabalhar no problema
Estágio dois: a difícil experiência de lutar tentando resolver o problema
Estágio tres: O momento criativo. Um ” flash of insight”.
Estágio quatro: A feliz solução do problema
Estes quatro estágios foram identificados tanto nas Humanidades quanto nas Ciências e na Psicologia o que mostra a existência dos mesmos processos psiconeuroendócrino-imunogenéticos em jogo, em todas as atividades humanas.
Em seu livro The New Neuroscience of Psychotherapy de livre acesso online, Rossi nos mostra que o processo criativo de quatro fases , tem sua correspondência no processamento dos quatro níveis psicobiológicos da interação mente-corpo-gene durante a expressão genética e o processo de plasticidade cerebral. Abaixo ampliamos e especificamos mais detalhadamente esse processamento molecular de quatro níveis:
1- A informação do mundo exterior codificada nos neurônios do córtex cerebral e no hipocampo é transformada no sistema límbico-hipotalâmico-pituitário em moléculas mensageiras (hormônios), que conduzem pela circulação a informação até os receptores das membranas celulares
2- Os receptores nas membranas celulares, transmitem o sinal, via segundos-mensageiros protêicos como a kinase A, ao DNA no núcleo da célula, onde genes reguladores comunicam aos genes efetores para transcrever seu código para o RNA mensageiro (RNAm).
3- Os RNAm transportam a mensagem genética do núcleo das células para os ribossomos no citoplasma, organela na qual se processa a síntese de proteínas. Esta transcrição do código genético, ocorre por meio da justaposição, um a um, dos aminoácidos selecionados a partir de cada tríade trazida pelo RNAm copiadas da linguagem do DNA do núcleo. Estas tríades são letras do alfabeto genético, a linguagem da vida, formadas pela sequência de três das quatro bases nitrogenadas – A adenina, T timina, G guanina e C citosina. Cada tríade corresponde a um dos 20 aminoácidos essenciais encontrados na natureza, disponíveis no citoplasma da célula. Esses aminoácidos no citoplasma da célula, são conduzidos ao ribossomo durante a síntese protêica, por um outro tipo de RNA, o RNA transportador (RNAt). Uma sequência de aproximadamente trinta aminoácidos unidos em sequência constitui uma proteína. As proteínas assim sintetizadas, são as estruturas últimas de cura do corpo e irão atuar em nosso organismo como:
a) Proteínas estruturais
Qualquer forma de cura ou regeneração orgânico-celular necessita de proteínas para se concretizar, pois as membranas celulares são constituídas por proteínas e lipídios.
b) Proteínas funcionais
Representadas pelas Enzimas e Anticorpos.
Enzimas são proteínas funcionais que facilitam as dinâmicas energéticas, aumentando a velocidade das reações químicas celulares, sem aumento de temperatura, através de reconhecimento estereoquímico (uma forma de cognição). Anticorpos são proteínas funcionais denominadas imunoglobulinas, que possuem a função de reconhecer e destruir células bacterianas, vírus invasores, e células mutantes como as células cancerígenas.
c) Proteínas receptoras
Funcionam como receptores e como canais transdutores de informação, nas membranas celulares.
d) Proteínas-mensageiras
São moléculas transportadoras de informação como os hormônios.
4) As moléculas-mensageiras funcionam como uma espécie de “memória molecular” sendo capazes de evocar memória dependente de estado, aprendizagem e comportamento nas redes neurais do cérebro.

Plasticidade Neural e Terapias Acadêmicas e Alternativas
Estimulamos a plasticidade cerebral com as novidades que entramos em contato, portanto qualquer forma de terapia seja ela alopática, homeopática complementar, alternativa, noética ou integrativa – e isto é de importância fundamental para o entendimento dos mecanismos de cura tanto dos tratamentos acadêmicos quanto dos tratamentos alternativos - provocarão mudanças nas redes neurais, na criação de novas memórias e geração de mais neuroplasticidade. Este dado, torno a dizer, é de fundamental importância, para compreendermos os mecanismos de ação, e interpretarmos os processos de cura em jogo nas terapias alternativas e acadêmicas. Neste contexto psiconeuroendócrinoimunogenético todas as formas de terapias, sejam elas acadêmicas ou alternativas, são válidas, pois estimulam os genes a expressar um código-DNA para sintetizar proteínas, que são as estruturas ultimas de cura do organismo, ie, “máquinas moleculares” promotoras da cura mente-corpo.
Este ciclo completo de comunicação e cura mente-corpo-gene, assim como a maior parte das atividades de nossa vida diária que levam comumente cerca de 90 -120 minutos para se concretizar, se relacionam com a liberação na circulação de diversos hormônios ativadores e inibidores da atividade celular. Esses hormônios, como o cortisol, a adrenalina, a testosterona, o hormônio do crescimento, o DHEA (dehidroepiandrosterona), e inúmeros outros neuropeptídios e neurotransmissores, possuem ciclos de liberação na circulação de mais ou menos 120 minutos, conhecidos como “Ciclos Ultradianos”, em contraste com o “Ciclo Circadiano” de 24horas. Em Cronobiologia este ciclo é conhecido como “Ciclo Básico de Repouso-Atividade” ou BRAC , na sigla em inglês.
Kandel (2006) demonstrou, que o Ciclo Ultradiano Básico de Atividade e Repouso (BRAC) quando estimulado por sinais novos e estimulantes do meio ambiente “liga” os genes atividade–dependentes, desencadeando a síntese de novas proteínas, facilitando a sinaptogênese e a plasticidade cerebral. Este processo de interação mente-cérebro, cérebro-corpo, e célula-gene, leva cerca de 90 a 120 minutos para se concretizar, sendo que a última etapa, célula-gene, gasta somente 20 minutos. Segundo Rossi, esta janela de tempo demonstra o tempo ideal para a realização da psicoterapia. Com efeito, este timing permitiria ao paciente criar novas redes neurais, estimulando a neuroplasticidade a partir dos insights surgido durante a psicoterapia e a estimulação corporal, se estiver realizando uma terapia mente-corpo.
E mais ainda, Rossi cita autores que demonstraram que este processo, pode ser representado por uma curva proteômica que demonstra a energia para o dobramento das proteínas nos neurônios, e por uma curva genômica representando a expressão genética para genes de expressão imediata como o c-fos, e mais 10 outros genes.

Consolidando a Memória
O neurocientista brasileiro Sidarta Ribeiro e col., em 2002 e 2004 , demonstrou que quando experienciamos novidades significativas, enriquecimento ambiental, ou quando nos exercitamos durante o estado de vigília, o gene zif-268 é expressado durante o sono REM, relacionado aos sonhos. Segundo ele:
“a reverberação neuronal sustentada durante o sono de ondas lentas, é imediatamente seguida por expressão de genes relacionados à plasticidade durante o sono REM, o que explica o benefício do sono na consolidação de novas memórias”.
Este gene zif-268 é um gene de expressão imediata relacionado a estados comportamentais e associado à geração de proteínas e fatores de crescimento neuronal que facilitam a plasticidade cerebral.
Em 2008, Ribeiro revelou a existência de “ciclos de plasticidade”, relacionados a três ondas espaço-temporalmente distintas da expressão do zif-268, que se inicia no hipocampo 30 minutos após estimulação, ainda durante a vigília, com propagação para áreas extra-hipocampais distais, durante os dois episódios subsequentes de sono REM. Cada onda reguladora ascendente (“up-regulation”) do zif-268 foi interrompida pelo próximo episódio de SWS (sono de ondas lentas, não relacionado ao sonho), indicando a existência de ciclos recorrentes de plasticidade, conforme os dois estados de sono alternavam.
As implicações terapêuticas desse processo são imensas, pois os sonhos funcionam como replays criativos, e a reverberação neuronal durante o sono de ondas lentas (sem sonhos), seguida pela expressão de gens relacionados à plasticidade cerebral durante o sonho, irão gerar transformações criativas na mente e no comportamento. Ao utilizarmos a janela de tempo deste ciclo de expressão genética e plasticidade cerebral para consolidar a reconstrução do medo, do stress, das memórias traumáticas e dos sintomas emocionais, durante a psicoterapia, a hipnose terapêutica, e as terapias mente-corpo, realizando o “dialogo criativo com nossos genes”, proposto por Rossi , aumentamos enormemente a possibilidade de sucesso em nossa intervenções terapêuticas.
Nossa experiência clínica nos vem demonstrando que a terapia auxiliada pela indução de estados amplificados de consciência, como a meditação, a oração, a visualização criativa, o relaxamento, são mais eficazes se respeitarmos esta sabedoria da natureza, esta janela de tempo de 90-120 minutos, do processo de interação mente-cérebro-gene. É muito importante orientarmos o paciente quanto à necessidade de um sono repousante, para que através dos ciclos de plasticidade possa consolidar o que foi percebido e compreendido como relevante durante o processo terapêutico .
Em resumo, quando despertamos do sono, sonho, contemplação, meditação, oração, ou ao realizarmos alguma forma de terapia, seja ela acadêmica ou alternativa, ou mesmo quando em nossa vida diária entramos em contato com novidades significativas, estamos facilitamos o diálogo criativo entre o córtex , o hipocampo, o sistema límbico, o sistema imunológico e o DNA, processo fundamental para a vida e a manifestação da consciência.
Como estas transformações naturais da mente, a modulação da expressão genética e a plasticidade cerebral são suscetível às influências ambientais e sociais, isso permite fazermos uma escolha entre o que Rossi denomina “resposta ultradiana de cura” e “resposta ultradiana de stress” que ocorrem naturalmente durante o dia, a cada duas horas aproximadamente:
“Propomos que o estresse crônico induzido por ignorar e pular esta fase natural de repouso do Ciclo Básico de Repouso-Atividade é uma fonte primária de desordens psicossomáticas que podem ser resolvidas mediante terapia mente-corpo via hipnose terapêutica” ( Lloyd e Rossi, 1992, 2008; Rossi & Nimmons, 1991).
Podemos ou não, desfrutar a fase natural de repouso-cura do ciclo. Se optarmos, por esta Resposta de Cura, obedecendo à sabedoria sistêmica da interação mente-corpo, podemos vivenciar as seguintes etapas segundo Rossi:

RESPOSTA ULTRADIANA DE CURA
1. Sinais de Reconhecimento do BRAC
Aceitação do chamado da natureza para relaxar, e da necessidade de repouso e recuperação de força e bem estar, desencadeando uma experiência de conforto e gratidão.
2. Respirar Profundamente
A respiração mais profunda chega naturalmente após alguns momentos de descanso. Sinal de que você está penetrando em um estado mais profundo de relaxamento e cura. Explore o profundo sentimento de conforto que chega espontaneamente. Relembre as possibilidades de comunicação e cura mente-gene, com uma atitude “compassiva e desapaixonada”.
3. Cura Mente-Corpo
Fantasia espontânea, memória, imaginação ativa e estados numinosos são orquestrados para a cura e reenquadre da vida. Algumas pessoas tiram uma “soneca”.
4.Rejuvenescimento e Despertar
Despertar natural com sentimentos de serenidade, clareza e cura e um sentimento de melhora do desempenho e bem estar.

Se ao contrário, como frequentemente ocorre, optarmos pela Resposta de Stress, então teremos a seguinte sequência de eventos:

SÍNDROME ULTRADIANA DE STRESS:
1. Rejeição do Chamado da Natureza
Rejeição do chamado da natureza, para a necessidade de repouso e
recuperação de força e bem estar, ocasionando uma experiência de stress e fadiga.
2. Liberação Hormonal
O esforço contínuo frente à fadiga leva à liberação de hormônios de stress provocando um curto-circuito no ciclo de repouso ultradiano. O desempenho prossegue às expensas de um desgaste oculto, gerando mais stress e necessidade de estimulantes artificiais como cafeína, nicotina, álcool, cocaína etc.
3. Mal Funcionamento Orgânico
Aparecem muitos erros no desempenho, memória e aprendizagem. Problemas emocionais, como depressão e irritabilidade tornam-se manifestos. Você pode ficar abusivo e descontrolado consigo e com os outros.
4. O Corpo Rebelde
Sintomas Psicossomáticos clássicos lhe dominam e você finalmente tem que parar e descansar. Fica uma sensação persistente de fracasso, depressão e doença.

Compreendendo o stress
Selye, criador do termo stress, define o stress como “um estado de tensão do organismo quando obrigado a utilizar suas defesas para enfrentar qualquer situação desafiadora”.
Quando estressados mobilizamos energia por meio do aumento da liberação da glicose, de oxigênio, de cortisol, e de adrenalina, aumentando o tônus cardiovascular, a frequência respiratória, melhorando a cognição e a memória-dependente do hipocampo, aumentando a liberação de dopamina nas vias de prazer, e suprimindo a reprodução, a imunidade, o crescimento, e a digestão.
Se a situação estressante se tornar crônica, os efeitos do stress a longo-prazo no organismo irão provocar diminuição da liberação de glicose, piora da função hipocampal e da memória com atrofia neuronal, diminuição da plasticidade sináptica, inibição da neurogênese, lesão e morte de neurônios, diminuição da liberação de dopamina, aumento da função da amigdala (relacionada ao medo e à ansiedade), ocasionando mudanças eletrofisiológicas e estruturais, e piora da função do córtex frontal e de sua função executiva, também desencadeando mudanças eletrofisiológicas e estruturais.
A não-resolução da situação crônica de stress irá desencadear o aparecimento das chamadas Doenças de Adaptação que são desordens orgânicas relacionadas ao stress, como hipertensão stress-induzida, doença cardíaca, derrames, diabetes, miopatias, síndrome da fadiga crônica, fibromialgia, ulceras, colite, amenorréia, impotência e diminuição da libido, nanismo psicogênico, aumento do risco de doenças, morte dos neurônios, notadamente no hipocampo, levando à perda progressiva de memória e até ao desenvolvimento de estados demenciais .
Quando alteramos o fluxo natural de informação, vivendo uma vida estressante , modificamos as liberações hormonais ultradianas e interrompemos o fluxo de inteligência que sustenta a vida (segundo a Medicina Ayurvédica tradicional da Índia, a doença é a interrupção do fluxo natural de inteligência).
Estamos sendo continuamente criados e reestruturados (rewired) durante toda a nossa vida! Hoje sabemos que manter durante a vida a atividade cerebral ativada continuamente por estímulos renovadores, aumenta exponencialmente a densidade das conexões neuronais, permitindo a superação do processo natural de envelhecimento e atrofia cerebral, desacelerando ou até mesmo impedindo o aparecimento dos processos de demenciação. Permite ainda desenvolvermos uma melhor capacidade neuroendócrina e imunológica que nos leva a suportar melhor, e superar a maior parte das doenças do envelhecimento!
Eric Kandel, com toda sua vitalidade, alegria de vida e longevidade que percebemos o tempo todo assistindo ao DVD In Search of Memory, nos parece exatamente o tipo de pessoa que conseguiu fazer de sua vida um estímulo à inteligência e à integridade mente-corpo!

Neurônios-espelhos, plasticidade cerebral, e experiências numinosas
Neurônios-espelhos são células recentemente descobertas que são capazes de mediar a empatia na psicoterapia, a transferência na psicanálise, e o rapport na hipnose terapêutica e nas terapias mente-corpo (Rossi, 2008). São de uma importância fundamental na intermediação da aprendizagem e do comportamento social nos contextos culturais em que vivemos, pois “constroem pontes entre os mitos e metáforas religiosas psicoespirituais de todas culturas, e a consciência”.
Rossi nos lembra que as interações psicossociais entre as pessoas, assim como a atuação dos contadores de estórias, cantores, dançarinos, oradores, atores, e políticos de todo tipo capazes de “conduzir” uma audiência, estão na verdade, promovendo por intermédio da ação dos neurônios espelhos, a expressão genética, a criação de novas redes neurais e estimulando a plasticidade cerebral.
“Procuramos construir pontes entre nossas experiências numinosas da arte , do belo, da verdade e da auto-criação em todos os níveis, da mente ao gene, fundamentando um novo approach bioinformático para a medicina, a psicoterapia e a reabilitação” (Rossi 2008).

Bibliografia selecionada da primeira parte

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O Aspecto Informacional-Holográfico da Consciência

Para levarmos nossa aventura adiante em busca da natureza da consciência, necessitaremos ultrapassar a visão molecular sintetizada acima, e a visão clássica de informação elaborada nos anos 40 do século XX por Claude Shannon, que desenvolveu uma teoria da comunicação dependente da capacidade em bits, que é incapaz de fornecer uma conexão adequada com o conceito de informação quântica não-local, e a consciência. Precisamos para isso de uma visão mais radical da informação para elaborarmos uma visão mais radical da natureza fundamental da consciência.
Stonier , físico, define informação como “ o princípio organizacional cósmico com um ‘status’ igual à matéria e à energia. David Chalmers que é um filósofo da mente, também propõe que “consciência é um aspecto irredutível do universo, como o espaço, o tempo e a matéria. Alguns físicos quânticos, como W. Zureck, ultimamente têm proposto uma Lei de Conservação da Informação, mais fundamental do que a Lei de Conservação da Matéria e Energia, que permitiria concebermos informação desta forma mais radical.
Em 1999, no paper Information Self-Organization and Consciousness, publicado nos USA e na Europa, propuz uma nova Teoria Holoinformational da Consciência, fundamentada na moderna física da informação quântica surgida nos anos 90. Neste trabalho, defini informação como “ uma propriedade intrínseca, irredutível, e não-local, do universo, capaz de gerar ordem, auto-organização e complexidade “. Nesta concepção mais ampla, informação passa a ser entendida como uma dimensão primária e irredutível, tão básica e incorporada à organização do universo quanto a energia, a matéria, e o espaço-tempo. Lembro-me com emoção ainda, do debate que esta idéia gerou, quando apresentei esta Teoria Holoinformacional da Consciência pela primeira vez, no congresso Science and the Primacy of Consciousness, na Universidade de Lisboa em Portugal, em 1998, tendo Karl Pribram como moderador. Durante o debate, após a minha apresentação, fui desafiado por um cientista, australiano, que me pediu que definisse melhor esta nova concepção de informação. De um modo mais intuitivo do que racional, em segundos, tive uma iluminação, um insight, e vislumbrei de imediato todo o conhecimento que me levara a esta definição, emergindo em minha mente a definição acima de informação. Ao ouvir esta definição, Pribram imediatamente se levantou, e se encaminhou em minha direção, cumprimentando-me e dizendo que concordava plenamente com minhas idéias. Foi o início de uma bela e profunda amizade que me permitiu trazê-lo ao Brasil, para ministrar a conferência magistral, O Modelo Holográfico de Consciência, no simpósio Fronteiras da Consciência, organizado no Rio, por mim e o colega Jairo Mancilla. Nesta oportunidade, pude passar alguns dias ao seu lado curtindo sua imensa sabedoria, e ao mesmo tempo lhe mostrando as belezas naturais do Rio, o Cristo Redentor, o Pão de Açucar, nossas famosas praias e restaurantes, o passeio de barco pela baía de Guanabara, nossas mulheres maravilhosas, e nosso povo alegre e descontraído.
O Reencontro da Ciência com a Consciência
Desde os anos 70 do século XX vem ocorrendo um renascimento do interesse científico sobre a natureza da consciência, que se acelerou imensamente nos anos 90, com a moderna tecnologia de neuroimagem que permitiu visualizarmos , o “fluxo da consciência”, descrito por William James, no século XIX. No entanto, filósofos da mente como David Chalmers, clamaram que o substrato neural da consciência não é a mesma coisa que a consciência em si, e que devemos estar alertas para o que ele denomina hard problem (o problema difícil) e easy problem (o problema fácil). O “easy problem”, - que não é tão fácil assim como pensam os filósofos - refere-se ao que compreendemos sobre o funcionamento do cérebro e a experiência consciente, com o uso da moderna ciência e tecnologia. O “hard problem” seria a experiência interior, nossa e dos outros, que experienciamos, por exemplo quando olhamos uma rosa vermelha, ou seja, a qualidade da nossa experiência consciente ou qualia. A rosa vermelha que admiramos e cheiramos não é o mesmo que o substrato neural desta experiência. A experiência interior da “vermelhitude” da rosa não são os comprimentos de onda da cor vermelha, nem o substrato neural que nossos modernas ressonâncias magnéticas com seus computadores estão descrevendo!!
Um novo Modelo de Consciência
O modelo de consciência que desenvolveremos aqui, permite introduzirmos a espiritualidade no arcabouço da Ciência, pois como a consciência (consciousness) passa a ser compreendida como o fluxo de informação quântico-holográfica que religa o cérebro e o Cosmos, nossa fonte primordial. Assim, os fenômenos transpessoais, parapsicológicos, paranormais, mediúnicos e religiosos são entendidos como processos normais da própria estrutura quantum-informacional-holográfica do universo. Nesta nova visão paradigmática, nosso cérebro é compreendido como parte de uma vasta mente espectral quântico-holográfica que assemelha-se à própria organização do cosmo, mas de modo diferente ao proposto pelo panpsiquismo. Somos muito mais vastos do que nossas consciências individuais, e partes ativas de uma complexa holoarquia quântica, na qual cada consciência contém a informação do todo, e pode acessá-la por meio de estados elevados de consciência que como veremos, otimizam o tratamento holográfico da informação neuronal. Nestes estados alterados de consciência podemos interagir com a ordem espectral “oculta” , “implícita”, descrita na teoria quântico-holográfica de David Bohm, e, com uma ordem superior superimplícita, talvez o objeto final de nossa busca, da qual somos feitos “à imagem e semelhança”, tal como o objeto real que gera o holograma! Este modelo unifica ainda as neurociências e as abordagens psicoterapêuticas transpessoais, com as tradições espirituais, fundamentando cientificamente uma nova cosmovisão transdisciplinar holística da consciência, mais abrangente do que o paradigma cartesiano-newtoniano predominante na ciência do século XX e XXI. Ao ser capaz de explicar todos os desenvolvimentos do antigo paradigma, e ir além explicando o fenômeno da consciência , podemos estar vivenciando uma mudança de visão de mundo na história da Ciência, tal como descrito por Kuhn.

O Modelo Holoinformacional da Consciência
Considero este modelo de consciência como uma extensão do dualismo interativo desenvolvido por Sir John Eccles nos anos 70 e 80, e do monismo ontológico desenvolvido experimentalmente desde os anos 60 por Karl Pribram, recentemente ampliado por mim e Richard Amoroso. É uma interpretação da natureza da consciência baseada em um modelo quântico-informacional holográfico da interação cérebro-consciência-universo, fundamentado em três pilares da ciência moderna :
1- O modelo dos campos neurais quântico-holográficos desenvolvido por Sir John Eccles e Karl Pribram.
2- A interpretação causal holográfica da teoria quântica desenvolvida por David Bohm.
3- As propriedades não-locais do campo quântico desenvolvidas por Hiroomi
Umesawa.
A idéia desenvolvida por Eccles de uma interconexão entre o cérebro e o espírito, por meio de microsítios quânticos denominados por ele dendrons, ( redes de dendritos ondulatórios) que se conectariam com os psychons (construtos filosóficos da mente), influenciou profundamente o desenvolvimento de minhas idéias nos anos 70, quando ainda estudante de medicina, pela primeira vez, entrei em contato com as idéias de Eccles.
O conceito que desenvolvo aqui é um conceito dinâmico de consciência baseado em um fluxo holoinformacional (informação não-local quântico-holográfica + informação local clássica newtoniana) interconectando a dinâmica quântica cerebral holográfica com a natureza quântico-holográfica do universo. Este fluxo holoinformacional é gerado pelo modo holográfico de tratamento da informação neuronal, que pode ser otimizado e harmonizado, por meio de práticas de meditação profunda, oração e outros estados de consciência ampliada. Estudos de mapeamento cerebral realizados durante a ocorrência desses estados elevados de consciência, demonstram um estado altamente sincronizado e perfeitamente ordenado das ondas cerebrais, que formam ondas harmônicas únicas, como se todas as freqüências de todos os neurônios de todos os centros cerebrais tocassem a mesma sinfonia ( Montecucco/ Di Biase).
Este estado ondulatório cerebral altamente sincrônico, gera o campo informacional- holográfico cortical distribuído não-local, responsável pela auto-organização da consciência que interconecta o cérebro humano ao cosmos quântico-holográfico descrito pela teoria quântica de David Bohm.
Como a informação holográfica se distribui por todo o sistema, os processos quânticos de interação entre dendrons e psychons, descritos por Eccles e Beck, não se limitam à fenda sináptica, como preconizado por eles, mas são muito mais amplos e holograficamente distribuídos por todo o cérebro. Como Pribram, vejo isto não como uma contradição, mas como uma extensão natural das idéias seminais de Eccles.
Os campos neurais holográficos
Karl Pribram vem dedicando sua vida à comprovação experimental de que o funcionamento cerebral, além das redes neurais clássicas, possui também um outro funcionamento de natureza quântico-holográfica. Sua teoria holonômica do funcionamento cerebral demonstrou a existência de um processo de tratamento holográfico da informação no córtex cerebral, denominado holograma neural multiplex, dependente dos neurônios de circuitos locais, que não apresentam fibras longas e cujos finos prolongamentos denominados teledendrons, não transmitem impulsos nervosos comuns. “São neurônios que funcionam no modo ondulatório, e são sobretudo responsáveis pelas conexões horizontais das camadas do tecido neural, conexões nas quais padrões de interferência holograficóides podem ser construídos”... “este aspecto muito diferente da função neural, tem sido, de modo sistemático, ignorado pela comunidade neurocientífica: o processamento que ocorre nos ramos mais finos do neurônio. Na extremidade distal de um axônio, onde ele faz sinapses e se conecta com outro neurônio, ele se divide em ramos denominados teledendrons, que se conectam aos dendritos (prolongamentos não axonais) de outras células, através de sinapses químicas e elétricas. Os teledendrons e os dendritos formam uma rede de finas fibras na qual ocorre um tipo de processamento que não envolve impulsos nervosos. Nestas redes ocorrem polarizações flutuantes (oscilatórias) – despolarizações e hiperpolarizações dependentes das diferenças de potencial elétrico nas membranas das finas fibras, o que constitui a base deste tipo de processamento. Minha hipótese é que o que nos torna conscientes, nossa experiência consciente, é devido ao que se passa nesta rede de processamento” (Pribram).
Pribram descreveu ainda uma “equação de onda neural”, resultante do funcionamento das redes neurais holográficas, que é similar à equação de onda de Schrödinger, equação fundamental da teoria quântica. Este holograma neural é um campo construído pela interação dos campos eletromagnéticos dos teledendrons e dos dendritos dos neurônios, de modo similar ao que ocorre durante a interação das ondas sonoras no piano. Quando tocamos as teclas de um piano, estas percutem as cordas provocando vibrações sonoras que se misturam, gerando um padrão de interferência de ondas. A mistura das frequências sonoras é o que cria a harmonia, a música que ouvimos. Pribram demonstrou que um processo similar está ocorrendo continuamente no córtex cerebral, por meio da interpenetração dos campos eletromagnéticos dos neurônios adjacentes, gerando um campo harmônico de frequências eletromagnéticas. Este campo constituído por padrões de interferência de ondas harmônicas, tal como no exemplo do piano descrito acima, pode ser calculado pelas transformações de Fourier, e funciona tal como o holograma descrito pela matemática de Gabor. É um campo distribuído holograficamente, ie, simultaneamente, por todo o cérebro, codificando e armazenando em um vastíssimo campo de informação não-local, a memória, e a consciência no plano biológico. Na teoria holoinformacional da consciência proponho que este campo cortical, é capaz de nos interconectar ao campo quântico-holográfico subatômico da própria estrutura do universo, descrito na teoria quântica de David Bohm, sendo assim responsável pela emergência dos fenômenos de religação de nossa mente com o cosmos descritos como de natureza espiritual (lembramos que a palavra religião tem origem no latim religare). Tal como no piano a harmonia, a música que ouvimos, não está localizada no piano, mas no campo ressonante que o circunda, as memórias e a consciência de um indivíduo não estão localizadas somente no cérebro, mas também no campo de informação holográfica distribuído que o envolve, se interconectando instantaneamente de modo não-local ao campo quântico-holográfico universal. Os conceitos de arquivos akáshicos e consciência cósmica, das tradições espirituais orientais, são uma bela metáfora deste processo de interconexão universal!

A Interconexão Matéria e Mente
As formulações matemáticas que descrevem a curva harmônica resultante das interferências das ondas, são as transformações de Fourier, as quais Denis Gabor aplicou na criação do holograma, enriquecendo estas transformações com um modelo em que o padrão de interferência reconstrói a imagem virtual do objeto, pela aplicação do processo inverso. Ou seja, a partir da dimensão espectral de frequências, pode-se reconstruir matematicamente, e experimentalmente, o objeto na dimensão espaço-temporal. Como Pribram descreve de forma brilhante : “Um modo de interpretar o diagrama de Fourier é olhar a matéria como sendo uma “ex-formação”, uma forma de fluxo externalizada ( extrusa, palpável, concentrada). Por contraste, o pensamento e sua comunicação (mentalização) são a conseqüência de uma forma “internalizada” ( negentropica) de fluxo, sua in-formação.” E mais adiante: “Existem duas importantes vantagens conceituais nesta formulação: 1) mente inefável se transforma em in-formação definida pelas descrições quantitativas de Gabor e Shanonn , que se relacionam à termodinâmica; e 2) a compreensão que a matéria como a experienciamos é uma ex-formação, uma conceitualização espaço-temporal.
Em um outro paper, Pribram refere que podemos instanciar ambos os lados da interação Cérebro/Mente de Eccles, e ir além afirmando que:
“no lado cerebral da interação, Eccles claramente define o que está propondo: existem estruturas de fibras finas e suas conexões ( sinapses) que constituem o que ele denomina dendrons. Mas no lado mental da interação, ele postula a existência de unidades não definidas denominadas psychons. Presume que os psychons operam nas synapses por meio de processos quânticos. Temos boa evidência que os dendrons de Eccles constituem campos receptivos em unidades sensoriais corticais (Pribram 1991). Os dendrons são constituídos por teledendrons pré-sinapticos, sinapses e dendritos pós-sinápticos . Eles constituem as estruturas de fibras finas, onde os processos cerebrais ocorrem. Como campos receptivos gerados de modo sensorial, podem ser mapeados como ondas comprimidas de Gabor, ou padrões “wavelet-like”, descritos pelas Funções Elementares de Gabor. Dennis Gabor (1946) chamou essas unidades de informação, de Quanta de Informação. A razão para esse nome é que Gabor usou a mesma matemática para descrever suas unidades, que Heisenberg usou para descrever as unidades do quantum microfísico, na física quântica. Aqui elas definem a unidade estrutural de processos ocorrendo no cérebro material.No entanto, Gabor inventou esta função, não para descrever processos cerebrais, mas para encontrar a máxima compressibilidade de uma mensagem telefônica enviada através do Cabo Transatlântico, sem destruir sua inteligibilidade. A função de Gabor então descreve tanto uma unidade de processamento cerebral, como uma unidade de comunicação. O cérebro é material, mas comunicação é mental. A mesma formulação matemática descreve ambos. A estrutura elementar de processamento no dendron material de Eccles, é idêntica à estrutura elementar de processamento no psychon mental (comunicação). Existe uma identidade estrutural no processo interativo dual. Resumindo: A identidade estrutural entre um processo material cerebral e um processo mental de comunicação é dependente da função (wavelet) de Gabor. A função de Gabor efetiva de modo concreto, o processo interativo dual que Eccles e Popper estão propondo. Eccles coloca a interação no interior da synapse. Isto não é contraditório com a ênfase colocada nas propriedades do campo receptivo das arborizações das fibras finas pré e pós-sinápticas, exceto pelo fato de que a interação não é limitada à fenda sináptica.”

O universo holográfico
Este modo de organização holográfica, é tambem o que David Bohm aplicou à teoria quântica. No modelo de universo de Bohm, o espaço e o tempo são misturados, "embrulhados" em uma dimensão espectral de frequências, uma ordem oculta, implícita, sem relações espaço-temporais. Quando neste campo de frequências surgem flutuações, “ondulações” mais intensas, padrões semelhantes aos holográficos estruturam uma dimensão espaço-temporal, uma ordem explícita, que corresponderia ao nosso universo manifesto.
Bohm afirma que “na ordem implícita tudo está introjetado em tudo. Todo o universo está em princípio introjetado em cada parte ativamente, por meio do holomovimento... O processo de introjeção não é meramente superficial ou passivo, e cada parte está num sentido fundamental, internamente relacionada em suas atividades básicas ao todo, e a todas as outras partes.
Metáforas cabalísticas de um microcosmo refletindo o universo, e alquímicas como “tudo o que está em cima é igual a tudo o que está embaixo”, e concepções como “o todo no tudo e o tudo no todo” , de Hermes Trimegistus descritas no Cabaillon, assim como o simbolismo das afirmações judaico-cristãs do tipo “O pai está dentro de nós”, e “Assim na terra como no céu” , são exemplos de que essa concepção holográfica está enraizada nos arquétipos da consciência humana desde os mais antigos pensamentos registrados.
Transcrevo abaixo a metáfora budista da Rede de Indra, que parece ser a primeira descrição de um sistema holográfico (ou como Capra coloca, de um sistema quântico bootstrap) na história humana, feita há cerca de 2500 anos.
“No distante castelo celeste do grande deus Indra, existe uma maravilhosa rede de jóias preciosas dispostas de tal modo que se estendem infinitamente em todas as direções. Cada jóia é um “ôlho” brilhante da rede, e como a rede é infinita em todas as dimensões, as jóias são em número infinito. Suspensas como estrêlas brilhantes de primeira magnitude, são uma visão maravilhosa para os olhos. Se olharmos de perto uma das jóias, veremos em sua superfície o reflexo de todas as outras jóias, e que cada uma das jóias refletida nela, está refletindo também todas as outras jóias, num infinito processo de reflexão”.
Segundo Francis Cook, a metáfora da Rede de Indra, “simboliza um cosmos em que existe uma infinita interrelação entre todas as partes, cada uma definindo e mantendo todas as outras. O cosmos é um organismo auto-referente, auto-mantenedor, e auto-criador.” É também não-teleológico, pois, “não existe um início do tempo, nem um conceito de criador, nem um questionamento sobre o propósito de tudo”. O universo é concebido como uma dádiva, sem hierarquia: “Não tem centro, ou talvez, se existe um, ele está em todo lugar”
O Aspecto Quântico da Consciência
A Dinâmica Quântica Cerebral
Estudos experimentais desenvolvidos por Pribram e outros pesquisadores como Hameroff, Penrose, Yassue, Jibu, confirmaram a existência de uma dinâmica cerebral quântica, nos microtúbulos neurais, nas sinapses, e na organização molecular do líquido céfalorraquidiano, desvelando a possibilidade de formação de condensados Bose-Einstein, e a ocorrência do Efeito Frohlich nestes sistemas. Os condensados Bose-Einstein consistem de partículas atômicas, ou no caso do Efeito Frohlich, de moléculas biológicas, que assumem um elevado grau de alinhamento, funcionando como um estado altamente unificado e ordenado, tal como ocorre nos lasers e na supercondutividade.
Jibu, Yasue and Pribram desenvolveram uma dinâmica quântica cerebral que é de natureza holonômica, baseada no conceito de logon, ie, na função (wavelets) de Gabor, e nas transformações de Fourier. Nessa concepção o universo e a própria estrutura quântico-holográfica da consciência, são concebidos como uma unidade, tal como na concepção de mônadas de Leibnitz. Em sua Monadologia, Leibnitz afirma que cada mônada , tal como um pequeno espelho, reflete em sua própria imagem o universo.
Norbert Wiener também acreditava nessa maneira holográfica de se compreender o universo, como vemos em sua afirmação : "Esse espelhamento é melhor compreendido como um paralelismo, incompleto é verdade, entre a organização interna da mônada e a organização do mundo como um todo. A estrutura do microcosmos corre paralela àquela do macrocosmo” (Wiener, Back to Leibnitz).
Acredito que o imenso padrão de interferências de todo o universo, incorporando todas as relações de fase, no que Bohm denomina Ordem Implícita, faça com que cada organismo seja um reflexo de todo o universo tal como uma mônada leibnitziana .
Pribram afirma que além de cada organismo refletir o universo é possível que o universo esteja refletindo cada organismo que o observa. Portanto cada consciência está continuamente refletindo o todo, e o todo está refletindo cada consciência, por meio do fluxo holoinformacional em um processo dinâmico infinito, que é distribuído e auto-referencial.

Biofótons, Microtúbulos e Superradiância
Fritz Popp demonstrou que o corpo humano emite fótons de luz por ele denominados biofótons, e que esses biofótons são capazes de serem transmitidos através dos tecidos humanos por meio de um processo denominado superradiância, no qual não ocorre nenhuma perda de energia ou informação.
Sabemos que os microtúbulos estudados por Hameroff e Penrose , são excepcionais condutores de pulsos de energia. Esses pulsos são transmitidos por túbulos que possuem as paredes constituídas pelas proteinas MAP2s que são modeladas de tal modo que os pulsos chegam inalterados ao outro extremo do microtúbulo. Hameroff descobriu ainda que existe um elevado grau de coerência quântica entre microtubulos vizinhos, e que eles poderiam funcionar como “dutos de luz” e “guias de ondas” para os fótons, enviando essas ondas de uma célula a outra através do cérebro sem perda de energia, exatamente como na superradiância. Este processo poderia organizar ou informar moléculas em um processo do tipo Efeito Frölich e agir sobre as moléculas dos sistemas do organismo humano de modo a energisá-las de modo positivo ou negativo. Richard Amoroso, e eu, estamos propondo uma nova teoria das doenças autoimunes, com base nesta possibilidade. É uma teoria imunológica noética com características auto-organizadoras e quântico-holísticas, perfeitamente compatível com a teoria clonal que deu o Premio Nobel a Niels Jerne. .
Yasue and Jibu também demonstraram que a informação quântica deve se processar por meio de campos vibracionais e coerência quântica através dos microtúbulos.
Pribram, Yasue, Hameroff e Scott Hagan do Dept of Physics da McGill University desenvolveram uma teoria sobre a consciência na qual os microtubulos e os dendritos podem ser vistos como a internet do corpo humano ( ver Quantum optical coherence in cytoskeletal microtubules: implications for brain function- BioSystems, 1994; 32: 95-209 ).
Os microtúbulos dos dendritos são bem diferentes dos microtúbulos dos axônios. Nos axônios os microtúbulos têm todos a mesma polaridade, e são contínuos. Já os microtúbulos dendríticos são curtos e interrompidos, com polaridades misturadas, e interconectados pela MAP2, a proteína associada aos microtúbulos, específica dos dendritos. Segundo Hameroff, os circuitos MAP2 dos microtúbulos dendríticos são ideais para redes de processamento informacional, enquanto os microtúbulos axonais unipolares são ideais para transferência de informação.
Por meio desse processamento quântico cada neurônio pode fazer login e ao mesmo tempo falar com outros neurônios simultaneamente, de modo não-local , como no fenômeno de entanglement, criando uma coerência global das ondas por todo o cérebro, e gerando o processo de superradiância. Os fótons poderiam assim ser transmitidos ao longo dos microtúbulos como se fossem transparentes, um processo físico conhecido como transparência auto-induzida, comunicando-se com todos os outros fótons do nosso corpo de modo instantâneo e não-local. Isso geraria uma cooperação coletiva das partículas subatômicas nos microtúbulos, que seria distribuída por todo o sistema nervoso e provavelmente por todas as células do nosso corpo.
Este processo poderia explicar a unidade dos pensamentos e da consciência, e o processamento instantâneo em nosso cérebro.
Os físicos italianos, Del Giudice and Preparata demonstraram que as moléculas de água no cérebro são campos de energia coerentes e se estendem até 3 nanometros, ou mais, para fora do citoesqueleto ( microtúbulos ), o que nos leva a pensar que as moléculas de água no interior dos microtúbulos possam estar ordenadas. Estes autores demonstraram que essa focalização e coerência de ondas pode produzir feixes de 15 nanômetros de diâmetros que é precisamente o diâmetro interno dos microtúbulos. Jibu e Hameroff chegaram à mesma conclusão demonstrando que os diâmetros internos de 15 nanômetros dos microtúbulos são perfeitos para guiar a luz de modo livre, sem perdas termais.
Esses experimentos levaram Del Giudice and Preparata a propor uma conclusão paradigmática, que já ocorrera a Fritz Popp, de que a consciência é um fenômeno global ocorrendo em todo o organismo, e não somente no cérebro. O que nos lembra o conceito de chakras, os centros de consciência dispostos pelo corpo, descritos nas tradições espirituais orientais.
Talvez a consciência seja luz coerente em sua essência, afirma Lyne McTaggart , em seu livro The Field.
Kauffman, em seu mais recente livro Reinventing the Sacred, 2008, relata que as pesquisas com moléculas envolvidas no processo de fotossíntese, demonstraram que a molécula de clorofila que captura o fóton, e a proteína antena que a mantém, suportam um estado de coerência quântica por um tempo muito longo. Parece que a proteína antena suprime a decoerência, reinduzindo coerência em partes decoerentes da molécula de clorofila. Kauffman afirma que “ desde que a super elevada eficiência na transferência de energia luminosa para energia química é crítica para a vida, esses resultados sugerem muito fortemente que a seleção natural atuou sobre a proteína antena para melhorar sua habilidade de sustentar o estado de coerência quântica”. Este fato experimental demonstra dados que revelam ser o processamento quântico um fato corriqueiro nos organismos biológicos, e que a tão falada decoerência quântica em temperatura corporal, que tornaria impossível a ocorrência de fenômenos quânticos na temperatura cerebral, clamada pela maioria dos críticos das teorias quânticas da consciência, é uma falácia. A fotossíntese é a prova natural e a comprovação experimental da possibilidade de existir coerência quântica no cérebro.

Unificando Mente e da Matéria
Esses processos quânticos distribuídos por todo o organismo, nos permitem conceber uma teoria unificada da mente e da matéria tal como a totalidade cósmica indivisível de David Bohm, e conceber o universo, nosso corpo e a consciência como uma vasta e dinâmica rede holoinformacional inteligente de troca de informações, energia e matéria.
Walter Schemp , o criador da holografia quântica, que hoje é a base do processamento de imagens por ressonância magnética, afirma segundo McTaggart, que todas as informações sobre os objetos em nosso universo, inclusive suas formas tridimensionais, dependem de flutuações que ocorrem no chamado Campo de Energia do Ponto Zero, um vastíssimo campo de energia preconizado por Puthoff. Na Teoria Holoinformacional esse campo de memória-informação corresponde ao campo quântico-holográfico universal, ou campo akhashico, conforme a terminologia de Laszlo, que em uma elaboração mais complexa e mais abrangente corresponderia ao Campo Noético de Richard Amoroso, co-autor comigo de diversos livros e trabalhos.
Schempp conseguiu calcular, recuperar e reestruturar essas informações codificadas no campo holoinformacional em forma de imagens, nas máquinas de ressonância magnética utilizando as transformações de Fourier, a matemática holográfica de Gabor e uma complicada matemática que ele denomina simpletic spinor vector . Posteriormente com a colaboração de Marcer desenvolveu um mapa matemático de como a informação é processada no cérebro que é na verdade uma demonstração matemática da teoria de Pribram.
Schemp e Marcer acreditam que nossas memórias estão no Campo do Ponto- Zero, que em minha proposta holoinformacional quântico-holográfica seriam o fluxo dinâmico holoinformacional entre o cérebro e o cosmos, de modo similar mas não idêntico ao holomovimento de Bohm. Como diz Mc Taggart : “Pribram e Yasue poderiam perfeitamente ter proposto que nossas memórias poderiam ser simplesmente, uma emissão coerente de ondas vindas desse Campo, e que as memórias a longo prazo seriam grupos estruturados de ondas de informação. Isso poderia explicar a instantaneidade deste tipo de memórias, que não necessitam de nenhum mecanismo de rastreamento que procure informações através de anos de memórias”.
Seja qual for o mecanismo de recepção no cérebro, que como demonstrou Pribram, está distribuído por todo o tecido encefálico por meio da função holográfica de Gabor, ele está continuamente acessando o que denominamos Campo Holoinformacional Universal.

A Consciência Holoinformacional
A interação cérebro-universo tem que ser obrigatoriamente uma conexão não-local, pois é instantânea, o que nos levou a expandimos nossa idéia em direção à essa proposta holoinformacional não-local, na qual os padrões dinâmicos quânticos cerebrais com suas redes neurais e campos quântico-holográficos, são parte ativa do campo informacional quântico-holográfico cósmico, gerando uma interconexão informacional simultaneamente não-local (quântico-holística), e local (mecanicística-newtoniana), ou seja, holoinformacional. Aplicando a propriedade matemática básica dos sistemas holográficos, que demonstra que cada parte do sistema contem a informação de todo o sistema, aos dados matemáticos da física quântica de Bohm, e aos dados experimentais da teoria holográfica de Pribram, propusemos, que esta interconectividade universal, baseada nos campos quânticos não-locais de Umezawa, nos permite acessar toda a informação codificada nos padrões de interferência de ondas existentes no universo desde sua origem, pois a natureza holográfica distribuída do universo, faz com que cada parte, cada cérebro-consciência, contenha a informação do todo, tal como nas mônadas de Lebnitz.
Para que esta conexão cérebro-universo possa se processar, é necessário aquietarmos nosso cérebro, sincronizando o funcionamento dos hemisférios cerebrais, e permitindo que o modo de tratamento holográfico da informação neuronal se otimize. Isto se consegue facilmente por meio das práticas de meditação, relaxamento e oração que comprovadamente sincronizam as ondas elétricas dos hemisférios cerebrais, e otimizam o tratamento holográfico da informação cortical, gerando um estado ampliado de consciência. Descrições das comprovações eletroencefalográficas e clínicas, com a respectiva bibliografia desse fenômeno podem ser encontradas em meu livro, O Homem Holístico, a unidade mente-natureza, Editora Vozes.
Em sistemas auto-organizadores como o cérebro humano, os “correlatos neurais” da consciência, não são estruturados somente por complexificações das relações locais mecanicísticas da matéria, mas são primordialmente, gerados pelo campo quântico-holoinformacional inteligente auto-organizador universal. A partir dessa dimensão oculta, espectral, se forma (ex-forma) a realidade explícita, que é o nosso universo material manifesto. O cérebro, que é parte desta realidade manifesta, gera por sua vez, sua própria realidade espectral a partir dos campos quântico-holográficos, que se formam nos padrões de interferência de ondas, nas interseções das flutuações eletromagnéticas nas finas fibras telesinaptodendríticas descritas por Pribram. Pribram denomina esta realidade espectral de “domínio pré-espaço-temporal de realidade potencial, porque na realidade experienciada de cada momento navegamos no espaço-tempo”.

O campo unificado da consciência
O cosmos é constituído por matéria vida e consciência, que são processos informacionais significativos, isto é, processos inteligentes com significados,ie, ordem transmitida através da evolução cósmica. Um universo auto-organizado como um campo quântico-holográfico, pleno de informação significativa local e não-local (holoinformacional), é um universo inteligente que funciona como uma mente, como o astrônomo inglês Sir James Jeans já tinha observado: "O universo começa a se parecer cada vez mais com uma grande mente , do que com uma grande máquina".
Este campo quântico-holográfico universal pode ser compreendido como uma internet cósmica inteligente. Uma mente cósmica!
Uma Consciência Holográfica Universal, como a Consciência Cósmica das tradições espirituais da humanidade!
Em resumo, nesta concepção holoinformacional do cérebro e do universo, consciência e inteligência são compreendidos como informação, como ordem significativa que se auto-organiza e se complexifica. São dimensões, com níveis de complexidade diferentes, mas que se superpõem, sendo possível afirmar que a dimensão consciência-inteligência-informação sempre esteve presente em todos os níveis de organização da natureza.
Matéria, vida e consciência não são entidades separadas, capazes de serem analisadas em um arcabouço conceitual cartesiano, analítico-reducionista, mas uma unidade holística indivisível, um campo quântico holoinformacional inteligente auto-organizador que vem se desdobrando há bilhões de anos em uma infinita e dinâmica holoarquia cósmica.


Einstein gostava de dizer “quero conhecer os pensamentos de Deus... o resto são detalhes”.
Estes códigos informacionais que in-formam o Universo, são os verdadeiros pensamentos de Deus... aquilo que verdadeiramente nos religa à nossa fonte! Foram colocados à nossa disposição, oferecidos como uma dádiva que não temos como compreender! Sua utilização correta pelo homem, imerso neste todo holoinformacional gerador de vida e consciência, e capaz de acessar esse todo, deve estar direcionada para a preservação desta linguagem universal, por meio de uma ética de Reverência pela Vida!
Esta, a nossa grande responsabilidade moral!


O bem consiste em preservar a vida, em lhe dar suporte, em procurar levá-la ao seu mais alto valor. O mal consiste em destruir a vida, em ferí-la ou destruí-la em plena florescência.
Albert Schweitzer, Prêmio Nobel da Paz



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